O Coração das Trevas, a que Ryszard Kapuscinski (ver aqui) faz referência é um extraordinário romance escrito por Joseph Conrad, a partir da sua experiência na, então, colónia belga, o Congo. Traça um quadro sombrio da natureza humana e descreve o que pode acontecer quando a linha entre o bem e o mal se esbate e um ser humano detém, subitamente, em suas mãos, o poder absoluto em relação à vida dos outros homens, utilizando-o, de uma forma egocêntrica, para cometer as maiores atrocidades .
O argumento do filme de Francis Ford Coppola, Apocalypse Now, baseou-se neste romance, passando o cenário da acção do Congo para a Guerra no Vietname. O tenente Willard é enviado numa missão ao Camboja para assassinar um coronel americano, Kurtz, que - diz-se - passou para o lado do inimigo.
Este filme apresenta-nos uma visão realista e trágica da guerra. Ao contrário do que acontece quando se joga (jogos de guerra) no computador, onde matar dá pontos e pode parecer divertido, na guerra real há suor, sofrimento, medo, morte, coragem, o confronto com o absurdo…
A vida verdadeira é bastante mais complexa e difícil que a realidade virtual dos jogos violentos que consomem muito do tempo livre (e também daquele que deveria ser dedicado ao estudo) de alguns alunos do ensino secundário.
3 comentários:
Há sempre aquela discussão: o livro ou o filme? Para mim, é quase sempre o livro. Situações há em que o filme não trai o livro e torna-se um bom complemento deste. Neste caso, porém, é claramente o filme. O livro foi uma das minhas grandes decepções. Talvez se explique pelo facto de o ter lido depois do filme e as expectativas serem muito elevadas. Ou não andar com disposição para o ler durante o tempo em que o fiz. Não sei. Penso que para os nossos alunos não será leitura apropriada. O filme, esse sim.
Cumprimentos,
JR
JR:
Julgo que não temos de escolher entre o livro e o filme, são diferentes e penso que são ambos excelentes. Discordo também da ideia que, para os nossos alunos, o livro não seja uma leitura apropriada. Quais são as razões que o levam a pensar desse modo?
Obviamente que não será uma leitura que interesse todos os alunos (nem sequer alguns professores, atrevo-me a dizer) como acontece, aliás em relação a muitos outros assuntos, filosóficos, científicos, literários... os que têm maturidade, conhecimentos ou sensibilidade são sempre alguns e não todos - provavelmente não são sequer a maioria.
Todavia, eu penso que cabe à escola e aos professores não oferecer palha a quem quer palha, o fácil em vez daquilo que é mais difícil e exige maior esforço intelectual. Embora, neste caso, eu compreenda que é mais fácil recordar o Marlon Brando a declamar "o waste land" do T.S. Elliot do que as descrições sufocantes que o narrador do livro, Joseph Conrad, faz das paisagens do Congo e da crueldade das pessoas.
Cumprimentos,
Sara Raposo
Provavelmente não me fiz entender bem. Eu não sou contra o esforço, bem pelo contrário.
Acho apenas que, perante alunos que não lêem e com enormes resistências perante a leitura, as sugestões literárias terão de ser muito cuidadosas, sob pena de o feitiço se virar contra o feiticeiro. Isto não significa, obviamente, dar aos alunos o esterco literário que mancha as nossas livrarias. Mas há que fazer algumas cedências, tendo sempre em mente uma boa conciliação entre a qualidade da obra e o prazer da leitura. É neste sentido que o livro de Conrad me provoca alguma dificuldade enquanto sugestão literária para os garotos. O que não significa que não haja alunos que gostem. Enfim, é tudo relativo, provavelmente haverá livros que eu aconselharia e a Sara nem tanto. Sei lá.
JR
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