quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Lucidez e esperança

Eis os pensamentos que a escritora Marguerite Yourcenar  atribui ao imperador romano Adriano, quando este já velho e doente faz uma reflexão acerca da sua vida:

“A vida é atroz; sabemos isso. Mas precisamente porque espero pouco da condição humana, os períodos de felicidade, os progressos parciais, os esforços de recomeço e de continuidade parecem-me outros tantos prodígios que compensam quase a massa enorme dos males, dos fracassos, da incúria e do erro. Hão-de vir as catástrofes e as ruínas; a desordem triunfará, mas também a ordem, por vezes. A paz instalar-se-á de novo entre dois períodos de guerra; as palavras liberdade, humanidade, justiça reencontrarão aqui e ali o sentido que temos tentado dar-lhes. Os nossos livros não desaparecerão todos; as nossas estátuas quebradas serão restauradas; outras cúpulas e outros frontões nascerão dos nossos frontões e das nossas cúpulas; alguns homens pensarão, trabalharão e sentirão como nós; ouso contar com esses continuadores colocados a intervalos irregulares ao longo dos séculos, com essa intermitente imortalidade.”

Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano, tradução de Maria Lamas, Editora Ulisseia (10ª edição), Lisboa, 1997, pág. 243.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Pordata: Base de Dados online

A “Pordata, Base de Dados de Portugal Contemporâneo” é um site em que o leitor poderá encontrar uma imensa base de dados online na área das Ciências Sociais. Eis alguns dos principais temas: População, Educação, Saúde, Justiça, Protecção Social, Emprego, Empresas, Cultura, etc.

A Pordata foi organizada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, cujo Presidente do Conselho de Administração é o sociólogo António Barreto.

Clique aqui para aceder.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Uma objecção ao argumento céptico dos erros e ilusões perceptivas

ilusão óptica

Esta imagem foi retirada daqui. Garanto que vale mesmo a pena visitar o site, onde poderá encontrar imagens de outras ilusões perceptivas e a sua explicação fisiológica e psicológica.

Os cépticos consideram que devemos duvidar do conhecimento baseado nos nossos sentidos. Justificam essa posição com o argumento dos erros e ilusões perceptivas, também referido por Descartes (mais detalhes a esse respeito no post Algumas imagens que nos levam a duvidar dos nossos olhos e o cepticismo radical). Mas  será este um bom argumento?

Vejamos uma refutação possível, apresentada pelo filósofo Stephen Law:

«Platão no Teeteto apresenta a visão do filósofo grego Protágoras: “As coisas são para ti como tu as percepcionas e para mim como eu as percepciono... O vento é frio para aquele que tem frio e não para o que não tem”. Perante a discórdia, como posso ter eu a certeza de que o que eu percepciono é real? Esses desacordos não mostram que os nossos cinco sentidos não são de fiar?

O desacordo acerca dos dados dos sentidos não é generalizado. Pelo menos as pessoas concordam que o ar é um gás, não um líquido. E costumam concordar sobre a existência de uma brisa (mesmo que não seja igualmente quente para todos). De facto, o desacordo sobre essas questões pressupõe que as nossas percepções são, em grande parte, concordantes, o que apoia a afirmação de que a percepção, afinal, pode fornecer conhecimento.

Outra das preocupações acerca da fiabilidade dos nossos sentidos prende-se com as ilusões ópticas. Por exemplo, quando objectos rectos rompem a superfície da água parecem curvados. Ilusões como esta não mostram que os nossos sentidos não são de fiar? Mais uma vez, não.

Esses erros de percepção são corrigíveis, ou pelo menos previsíveis, dados os conhecimentos sobre o comportamento da luz, entre outros. Aquilo que eu vi anteriormente (o objecto que é recto; o efeito da água na aparência das coisas) pode ser usado para corrigir aquilo que parece que estou a ver agora. Assim, as ilusões não são boas razões para supor que os nossos sentidos são, de um modo geral, falíveis (1)

Outro exemplo ilustrativo do facto referido anteriormente é o que acontece no cinema, o chamado fenómeno do movimento aparente. Se a película de um filme fosse rodada lentamente, nós veríamos uma sequência de imagens estáticas. Todavia, como essa película é passada a uma certa velocidade, as imagens são vistas em movimento. Esse movimento é ilusório, na realidade não existe. É apenas uma consequência de mecanismos fisiológicos dos olhos e do cérebro do observador, os quais determinam o modo como os estímulos exteriores são captados e a informação é organizada e interpretada. Podemos, então, perceber porque razão os nossos sentidos nos fornecem, neste caso, uma imagem falsa da realidade. A explicação racional deste fenómeno permite compreender e corrigir o conhecimento enganador que a percepção fornece.

Serão estas objecções mais plausíveis que o argumento dos erros e ilusões perceptivas?

Ou será que, como os cépticos radicais dizem, pelo facto dos nossos sentidos nos enganarem algumas vezes teremos de concluir que nos enganam sempre?

(1) Stephen Law, Guias Essenciais – Filosofia, Civilização Editora, Porto, 2009, pág. 53.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Cândido na ilha da Madeira

temporal madeira ajudarVoltaire (1694-1778) escreveu uma novela chamada “Cândido” em que ridiculariza a ideia de que este mundo é o melhor mundo possível e que foi criado por uma providência sábia, que o governa com bondade e misericórdia. Um filósofo chamado Leibniz (1646-1716), para resolver o problema do mal, argumentara que seria contraditório considerar que Deus é omnipotente, omnisciente e sumamente bom e depois dizer que tinha criado um mundo defeituoso e repleto de mal. Afirma portanto que este mundo, tal como é, é o melhor dos mundos possíveis e que não teria sido possível criar um mais perfeito. (A respeito do problema do mal veja o post Se Deus existe porque é que acontecem coisas tão más?)

Voltaire faz Cândido sofrer toda a espécie de desventuras. Às boas pessoas que encontra só sucedem desgraças, tendo as malvadas normalmente melhor sorte. Perante isso, o Doutor Pangloss, mestre filosófico e amigo de Cândido, procura sempre fazer interpretações optimistas, argumentando como Leibniz: as coisas más que acontecem só aparentemente são más, pois através delas alcançam-se bens maiores.

Um dos lugares que Cândido visita nas suas deambulações é Lisboa, durante o grande terramoto de 1755, que muito impressionou Voltaire.

“Depois de se refazerem um pouco [do naufrágio do navio em que viajavam e do qual sobreviveram apenas três pessoas], encaminharam-se para Lisboa; restava-lhes algum dinheiro, com o qual esperavam salvar-se da fome, depois de haverem escapado à tempestade. Mal entravam na cidade, chorando a morte do benfeitor [um amigo que se afogara], quando sentem o solo tremer sob os seus pés; o mar, furioso, galga o porto e despedaça os navios que ali se acham ancorados. Turbilhões de chama e cinza cobrem as ruas e praças públicas; as casas desabam; abatem-se os tectos sobre os alicerces que se abalam; trinta mil habitantes são esmagados sob as ruínas. (…)

Depois do tremor de terra que destruiu três quartas partes de Lisboa, os sábios do país não encontraram meio mais eficaz para prevenir uma ruína total do que oferecer ao povo um belo auto-de-fé; foi decidido pela Universidade de Coimbra que o espectáculo de algumas pessoas queimadas a fogo lento, em grande cerimonial, era um infalível segredo para impedir que a terra se pusesse a tremer. Tinham, pois, prendido um biscainho que se casara com a própria comadre, e dois portugueses que, ao comer um frango, lhe haviam retirado a gordura: vieram, depois do almoço, prender o Doutor Pangloss e o seu discípulo Cândido, um por ter falado e o outro por ter escutado com ar de  aprovação: foram ambos conduzidos em separado para apartamentos extremamente frescos, onde nunca se era incomodado pelo sol”.

O Doutor Pangloss foi enforcado dias depois, mas Cândido escapou e continuou as suas viagens, tentando manter o optimismo e a crença na providência divina, apesar das desgraças constantes que observava. Na actualidade, Cândido teria certamente passado pelo Haiti e, embora não faltem calamidades no planeta Terra, talvez tivesse chegado ontem à ilha da Madeira.

E, nesse caso, além de questionar a providência divina, poderia também questionar as instituições que, em Portugal, determinam onde se pode e não se pode construir casas, bem como as decisões dos próprios cidadãos a esse respeito.

(O excerto do “Cândido” foi retirado daqui.)

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Informação “útil” para adolescentes sobre a hora de deitar

proibido dormir

Muitas pessoas têm como verdadeira a crença: os adolescentes não precisam de dormir tanto como os pré-adolescentes e, devido a isso, podem deitar-se mais tarde.

Trata-se de uma ideia do senso comum - muito popular entre os adolescentes - tida como certa por se ouvir dizer ou devido a alguns dados fornecidos por observações e experiências ocasionais.

De acordo com a concepção tradicional (ou platónica) de conhecimento, as três condições suficientes para que alguém possa dizer que sabe alguma coisa são ter, em simultâneo, uma crença verdadeira justificada. Assim sendo, quando uma pessoa conhece algo terá de ser capaz de apresentar provas, ou seja fundamentar racionalmente a verdade daquilo em que acredita, pois esta é independente da convicção pessoal e da confiança  depositada na tese defendida.

Ora, segundo uma notícia do jornal Público (6-1-2010): “James Gangswisch e colegas, da Universidade de Columbia, em Nova Iorque estudaram os hábitos de mais de 15.500 estudantes dos ensinos secundário e superior e descobriram que os que se deitavam depois da meia-noite tinham um risco de 24 por cento maior de ter depressão (…) do que os que iam para a cama antes das 22h. E tudo porque estes conseguiam dormir, em média mais de oito horas diárias.”

O estudo científico referido ao mostrar que a diminuição das horas de sono tem efeitos negativos, por exemplo uma maior tendência para a depressão, permite concluir que a ideia de que os adolescentes podem deitar-se tardíssimo, e no dia seguinte acordar cedo, corresponde a uma crença falsa e sem justificação. 

Portanto, essa crença não constitui conhecimento.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Uma defesa contra a falta de sentido para a vida

Em resposta à pergunta colocada pela leitora Fernanda Colaço (aqui) ficam algumas palavras de Primo Levi, escritor italiano.
“Os objectivos de vida são a melhor defesa contra a morte”.
(Cito a partir do Jornal Público, sem data, porque  não sei qual obra original em que a afirmação foi feita.)
Primo Levi quer dizer que a vida tem sentido se a pessoa estabelecer metas, exequíveis e valiosas para si, e procurar atingi-las. Pode não conseguir alcançar algumas (como por exemplo manter uma relação amorosa feliz), mas mesmo assim sentir que a vida vale a pena.
Primo Lévi
Primo Levi (1919-1987)

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Aprender implica ensinar

“Para que se aprenda é necessário, obviamente, ensinar” afirma Helena Damião no post “A óbvia necessidade de ensinar e de aprender”, no blogue De Rerum Natura. Como é sabido, algumas pessoas defendem que as crianças entregues a si próprias e pesquisando livremente conseguem aprender o que é importante aprender.

O post inclui um texto interessante do filósofo e pedagogo norte-americano John Dewey (1859-1952), que justifica essa necessidade com um argumento sociológico: quando nascemos não sabemos aquilo que é necessário saber para fazermos parte da sociedade e termos uma vida produtiva e satisfatória.

John Dewey

domingo, 14 de fevereiro de 2010

S. Valentim: O amor ou o sonho do amor?

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Fotografia de Elliot Erwitt (nascido em 1928), fotógrafo da agência Magnum.

“Não há uma ciência do amor porque este é demasiado vário e próteo para se lhe poder aplicar uma teoria. As pessoas tentam amar como os montanhistas tentam escalar o Evereste: trepam com o auxílio  dos pés e das mãos, e acabam por acampar no sopé da montanha, ou a meio da ascensão, onde quer quer que os seus compromissos os deixem. Alguns chegam suficientemente alto para ver a vista, que todos sabemos ser magnífica, pois todos a vislumbrámos já em sonhos. E é precisamente disso que trata a festa de S. Valentim: o sonho do amor. A vida seria realmente amarga se esse sonho nunca se tornasse realidade (…).”

A. C. Grayling, O significado das coisas, Lisboa, 2002, Edições Gradiva, pp. 91-92.

Pode ver outras fotografias de Elliot Erwitt aqui.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

As naturezas-mortas e a transitoriedade da vida

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Pieter Claesz (1596/97-1660)
Vanitas
com Rapaz com Espinho (Spinario), 1628
Óleo sobre madeira, 70,5 x 80,5 cm
Amesterdão, Rijksmuseum
© Rijksmuseum, Amsterdam

Encontra-se na Gulbenkian uma exposição de pintura a não perder, intitula-se:

“A Perspectiva das Coisas. A Natureza-Morta na Europa (1ª parte): Séculos XVII - XVIII”

De 12/02 a 02/05/2010
Das 10h00 às 18h00
Terça a Domingo
Galeria de Exposições Temporárias da Sede

“Uma exposição internacional dedicada ao tema da pintura de Natureza-morta na Europa – a primeira do género a realizar-se em Portugal - e que será apresentada em duas partes. A primeira, a realizar entre 12 de Fevereiro e 2 de Maio, será constituída por 71 pinturas dos séculos XVII e XVIII. A produção dos séculos XIX e XX será exibida mais tarde, entre 20 de Outubro de 2011 e 8 de Janeiro de 2012.

 
A exposição pretende explorar os temas recorrentes da natureza-morta ao longo de quatro séculos de história: naturezas-mortas com frutos, caça, cozinhas e mesas de banquete, pintura de flores, instrumentos musicais, gabinetes de curiosidades, Vanitas e obras em trompe-l’oeil. A diversidade do tratamento artístico destes temas nos vários países será demonstrada através do confronto de obras como, por exemplo, as naturezas-mortas das pintoras Louise Moillon e Fede Galizia, ou as cenas de cozinha de Jean Siméon Chardin e Luis Meléndez.

A colectânea reunida propõe-se examinar o amplo significado cultural e social da pintura de objectos e de alimentos. Os diversos sentidos da natureza-morta serão tratados em profundidade: imagens conciliadoras de satisfação material podem conter igualmente mensagens morais sobre os conceitos de abundância e consumo, mas também uma chamada de atenção para a transitoriedade da vida, sobretudo evidente nos exemplos presentes da secular tradição da Vanitas, tanto nos países católicos como nos protestantes.


Integram a exposição obras de nomes fundamentais que cultivaram este género, como Juan Sanchéz Cotán, Juan van der Hamen, Pieter Claesz, Juan Zurbarán, Rembrandt van Rijn, Antonio de Pereda, Nicolas Largillièrre, Jean Baptiste Oudry e Francisco de Goya. As obras provêm de várias colecções privadas e de museus como a National Gallery of Art de Washington, o Metropolitan Museum de Nova Iorque, o Museu do Louvre, o Museu do Prado, o Rijksmuseum de Amesterdão, o Mauritshuis de Haia, a National Gallery de Londres, o Fitzwilliam Museum de Cambridge, entre tantos outros.

Preço: 5€

As informações citadas foram retiradas do site da Fundação Calouste Gulbenkian.

Os quadros presentes nestas exposição podem ser vistos aqui.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Actividades para a aula de substituição de 5ª (turmas D e E do 10º ano)

Leia da página 137 à página 142 do manual e responda às seguintes questões:

1. Distinguem-se duas formas de relativismo moral. Indique quais.

2. Quais são as ideias comuns a essas duas perspectivas?

3. Qual é a tese do Subjectivismo Moral acerca da natureza dos juízos morais?

4. Como é que, do ponto de vista do Subjectivismo Moral, se pode avaliar o desacordo entre uma pessoa X que julga a pena de morte moralmente injusta e uma pessoa Y que julga a pena de morte moralmente justa?

5. Explique os seguintes argumentos a favor do Subjectivismo Moral: o argumento da liberdade e o argumento da tolerância.

6. Explique as seguintes objecções ao Subjectivismo Moral: É auto-refutante; inviabilizaria a discussão de questões morais; a discórdia existente em muitas questões morais não prova a inexistência de verdades objectivas nessa área.

7. Formule outra objecção ao Subjectivismo Moral.

8. O que é mais plausível, os argumentos a favor do Subjectivismo Moral ou as objecções? Porquê?

Bom trabalho!

E bom Carnaval!

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

A diversidade cultural: uma tradição dos países de Leste

Pedi aos alunos, ao explicar a teoria do relativismo cultural, que apresentassem tradições de diferentes países.

A minha aluna do 10º A, Anastasia Borozan, deu o exemplo de uma tradição, popular do seu país, que se festeja agora em Março.

Vale a pena conhecer a lenda associada a esta tradição e o significado simbólico deste costume. Obrigada Anastasia! Gostei muito do que me ensinou!

Na Moldávia e na Roménia, no dia um de Março, as pessoas costumam festejar a chegada da Primavera.

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É uma tradição que deriva de uma lenda. Actualmente, há várias versões desta lenda. Uma delas é sobre um príncipe que foi salvar o Sol porque este tinha sido raptado por um dragão. O príncipe seguiu numa longa viagem. Levou o Verão, o Outono e o Inverno todo a procura do dragão para recuperar o Sol. Quando o encontrou, lutaram dias e noites até que, finalmente, o príncipe derrotou o dragão e levou o Sol às pessoas. O Sol trouxe novamente a vida e a alegria à Terra.

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O príncipe não chegou a ver o Sol a brilhar no céu, nem a chegada da Primavera, pois estava bastante ferido e fraco. Caiu no chão coberto de neve. O seu sangue quente fez derreter a neve debaixo da qual, de seguida, se ergueu uma flor branca. A primeira flor a desabrochar depois dos grandes frios de Inverno (em inglês Snowdrop).

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A partir daí, as pessoas começaram a festejar a chegada da Primavera usando cada uma um “Martisor”. É o símbolo deste feriado. É um objecto que as mulheres bordam com um fio branco e outro vermelho.

A cor vermelha representa o amor, recordando também o sangue do jovem príncipe que salvou o Sol. A cor branca, devido a cor da primeira flor a nascer na Primavera, simboliza a pureza e a saúde.

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As pessoas costumam trocar ou oferecer “Martisore” e usam-nos no lado esquerdo, perto do coração. O “Martisor” usa-se até ao fim do mês de Março. Quando o mês acaba as pessoas prendem-no a uma árvore para esta dar bons frutos.

Anastasia Borozan

Este trabalho insere-se no projecto B.I.A (ver página da escola Secundária de Pinheiro e Rosa) , cujos objectivos são os seguintes: "propõe-se divulgar e apresentar a toda a comunidade escolar, a outras escolas e à comunidade em geral, os vários “habitats” culturais dos nossos alunos, através de múltiplas actividades a desenvolver ao longo dos anos lectivos de 2009 a 2011 e com a participação de toda a comunidade educativa que queira fazer esta “viagem” pelos trilhos da interculturalidade."

Vale a pena ler

Helena Damião publicou recentemente no blogue De Rerum Natura alguns textos que vale a pena ler. Temas: as condições de trabalho dos professores, as finalidades do ensino e os métodos de ensino. Eis três deles:

Ensinar na era da insegurança.

O problema mais importante e urgente.

Mitos educativos da actualidade.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Enterrar viva uma pessoa é errado ou isso é relativo?

Medine memi foi enterrada viva crime de honra Medine Memi, uma rapariga turca de 16 anos, foi enterrada viva pelo pai e pelo avô. Tratou-se de um castigo para o facto de ser amiga de alguns rapazes. Segundo esses familiares, tal amizade constituía uma desonra para ela e para a família, pelo que merecia a morte.

Segundo o jornal i, «os chamados ‘crimes de honra’ continuam a causar cerca de 300 mortes por ano na Turquia, apesar dos esforços do governo turco e de inúmeras associações de defesa dos direitos humanos. Em 2004, pressionado pela União Europeia, o governo acabou por alterar o código penal do país retirando o artigo que reconhecia atenuantes nos crimes de honra».

Apesar da oposição do governo turco e das campanhas promovidas pelas associações de defesa dos direitos humanos, essa prática é aceite por largos sectores da população. Trata-se de uma tradição. Presumivelmente, a sua aceitação não é ainda maior devido à acção do governo e dessas associações.

Segundo o relativismo moral cultural, o bem moral é aquilo que a maioria das pessoas de uma sociedade considera correcto. O que é considerado correcto numa sociedade pode ser considerado errado noutra sociedade. Não existe nenhum critério objectivo e universal para determinar quem tem razão. Por isso, as pessoas de cada uma dessas sociedades devem viver de acordo com os costumes da sua sociedade e agir do modo que lá se considera correcto e abster-se de criticar os costumes da outra sociedade. Se o fizerem estarão a ser arrogantes e intolerantes. Estarão a ser etnocêntricas. (Ler mais acerca dessa teoria aqui.)

Assim, se essa teoria for verdadeira não devemos criticar o pai e o avô de Medine Memi. Mais: os políticos turcos e os membros de associações de defesa dos direitos humanos que têm desenvolvido diversas acções para convencer as pessoas de que os “crimes de honra” são errados terão dado mostras de intolerância.

Mas essa teoria será realmente verdadeira? O bem moral será realmente identificável às tradições maioritárias de uma certa sociedade? Criticar os costumes tradicionais de uma sociedade será necessariamente um acto intolerante?

Há várias razões para pensar que a resposta a essas perguntas é “não”.

Na imagem, o buraco onde Medine Memi foi enterrada viva.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

As nossas vidas resultam do acaso?

Se  o acaso tem um papel fundamental naquilo que nos acontece, então, o melhor é admitirmos  “seja lá o que for que funcione” (em inglês: “whatever works”). Seja ou não assim, é isto que os personagens do novo filme de Woody Allen fazem.

E o resultado é uma comédia onde assistirmos à vida banal de algumas pessoas, em que as conversas incidem, muitas vezes, sobre temas filosóficos fundamentais: o sentido da vida; o livre-arbítrio; a existência de Deus; o certo e errado do ponto de vista moral… Tudo isto em  situações e diálogos hilariantes.

Woody Allen, no seu melhor, com os  temas habituais e a ironia do costume. Imperdível!

Para saber mais, sobre o filme e os cinemas onde está em exibição, pode ver aqui.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Possibilidades Alternativas: uma objecção ao Determinismo Moderado

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O Determinismo Moderado considera que o determinismo e o livre-arbítrio são compatíveis. O desejo do agente é o último elemento de uma cadeia causal constituída por causas que o agente não controla, mas que não lhe tiram a liberdade. Desde que nenhuma coacção imediata o impeça de agir de acordo com esse desejo o agente é livre. A sua acção é simultaneamente determinada e livre. Mas será mesmo assim?

Muitos críticos do Determinismo Moderado consideram que não. Argumentam que, para que se possa considerar que o agente foi livre ao realizar uma certa acção, é indispensável que ele tivesse possibilidades alternativas de acção, ou seja, que ele não pudesse fazer apenas uma coisa, mas que isso não sucede se todas as acções estiverem determinadas por causas anteriores.

“Há possibilidades alternativas quando o agente no momento imediatamente anterior à sua decisão, tem ainda diante de si mais do que um curso de acção e a acção podia ter sido diferente do que foi mantendo-se todos os outros factores inalterados. Ele disporia de alternativas reais se, e só se, a sua decisão pudesse ter sido outra, mantendo-se tudo o mais idêntico: as circunstâncias em que se encontrava, mas também a sua personalidade, as suas crenças e os seus desejos.” (Adaptado a partir de: Paulo Ruas, “O Problema do Livre-arbítrio”, Crítica - http://criticanarede.com/met_savater.html).

Vejamos um exemplo.

Évarist Galois aceitou participar num duelo contra um indivíduo muito mais hábil que ele no manejo das armas, pois no país e na época em que viveu recusar o desafio para um duelo era considerado uma manifestação de cobardia e quem o fizesse ficava publicamente desonrado e era alvo do desprezo geral. Há pessoas cuja personalidade as torna indiferentes à opinião e sentimentos dos outros, mas Galois não era como elas. (Mais pormenores aqui.) Galois agiu livremente? Ele tinha possibilidades alternativas de acção? Ele podia ter feito outra coisa? Tendo em conta o conceito de possibilidades alternativas referido, a resposta a essas perguntas terá de ser negativa. A influência dos costumes sociais e a sua personalidade (produto de diversos factores sobre as quais não tinha controle), levaram Galois desejar fazer o duelo e depois levaram-no fazer efectivamente o duelo.

Imagine-se dois mundos exactamente iguais em tudo até ao momento da decisão de Galois. Seria possível num dos mundos ele aceitar o duelo e no outro recusar? Não parece possível, uma vez que a sua personalidade, as suas crenças e desejos seriam iguais.

Por isso, argumentam os críticos, a tentativa do Determinismo Moderado conciliar o determinismo e o livre-arbítrio não foi bem sucedida. O determinismo impede que haja reais possibilidades alternativas de acção e sem isso não pode haver livre-arbítrio.

Os defensores do Determinismo Moderado rejeitam essa objecção, pois consideram que esta se baseia num conceito incorrecto de possibilidades alternativas. Não faz sentido exigir que o agente deseje fazer X e possa não o fazer para haver possibilidades alternativas de acção, pois o livre-arbítrio consiste precisamente em poder fazer o que se deseja. Argumentam que Galois podia ter feito outra coisa se tivesse desejado outra coisa e que é isso que significa ter possibilidades alternativas de acção.

“Se a série de causas que conduziu à decisão de aceitar o duelo incluísse outros desejos e crenças, se a sua personalidade fosse em algum aspecto diferente, então, no caso de nada o impedir (ou seja, de não haver coações imediatas), Galois poderia não ter aceite o duelo.” (Adaptado a partir de Paulo Ruas, op. cit.)

Por isso, argumentam os deterministas moderados, o determinismo permite a existência de possibilidades alternativas de acção e é compatível com o livre-arbítrio

O que é mais plausível, a objecção ou a crítica à objecção?

Uma nota final, para continuar a pensar. A personalidade, as crenças e desejos de uma pessoas são o produto de inúmeras causas anteriores que o agente não controla. Muitas vezes vemos pessoas desejarem coisas que nos parecem ser contra os seus interesses, embora elas não se apercebam disso. Se é assim, estará o Determinismo Moderado certo quando considera que somos livres sempre que fazemos o que desejamos?

Bibliografia:

Howard Kahane, “Livre-arbítrio, determinismo e responsabilidade moral”, Filosofia e Educação (http://www.filedu.com/hkahanelivre-arbitriodeterminismo.html).

James Rachels, Problemas da Filosofia, tradução de Pedro Galvão, Gradiva, Lisboa, 2009.

Paulo Ruas, “O Problema do Livre-arbítrio”, Crítica (http://criticanarede.com/met_savater.html).