quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Tempo perdido

imageA fotografia foi tirada  daqui.

Guilherme Valente, num  post do Rerum Natura  (que vale a pena ler na integra), escreveu:

"Como prevíramos, 30 anos de eduquês tornaram o Pais mais ignorante, incompetente, egoísta, corrupto, mentiroso, violento e brutal. Uma evidência quotidiana."

Como professora do ensino secundário, há mais de vinte anos, eu penso que há poucas exceções a esta descrição feita pelo editor da Gradiva. De facto, mesmo os alunos com potencialidades acabam por se acomodar a um sistema educativo que lhes exige o mínimo. Andam entediados na escola: não gostam de ler, não gostam de aprender, não gostam de estudar, não valorizam o conhecimento e assumem tudo isso com a maior das naturalidades. Só têm direitos, não têm deveres. Os outros - os pais, os professores, a escola, o Estado - existem para os servir. Andaram anos a fio na escola e foi isto que aprenderam, em vez de valorizar o trabalho e o conhecimento, prezam o prazer imediato e estão-se nas tintas para obter uma verdadeira formação que lhes permita preparar para a vida, pensando  no futuro deles e do país e ingressar  - com competência e seriedade - no mercado de trabalho. Um dos maiores males do eduquês foi não só contribuir para esta situação, mas sobretudo fornecer uma justificação teórica para a legitimar.

Como é que se pode ensinar alguém que não quer aprender e que tem este tipo de atitude em relação às aulas e à escola? É difícil, produz um desalento diário e pouca esperança no futuro. Contudo, é preciso remar contra a corrente, não desistir de ensinar aqueles - poucos - que ainda querem aprender.

6 comentários:

Anónimo disse...

Não concordo.
São os tempos que se vivem em todo o lado. É ocidental, logo decadente. É do sul, logo indolente.
Mas repare, não é mais ignorante. Mais era antes. No tempo da outra senhora.
Também não é mais incompetente. As competências são é outras. São relativas.
Egoísta, sim.
Corrupto, talvez. Pelo menos vê-se mais, agora.
Mentiroso, relativo.
Violento e brutal, só se excluirmos o que provinha do institucional/policial.
Agora o que é que a escola tem para ensinar? e os seus professores?
Por acaso ensinam a pensar? nalgumas áreas, talvez. Mas por acaso ensinam a fazer coisas? Não. Nada!
E que professores nós temos hoje?
Exactamente os formados no eduquês, logo, "fracos", para não seguir o excerto inicial dos implacáveis adjectivos.
E, parados no tempo, irredutíveis, intra-grades das escolas, sem abertura ao mundo de fora, que até é mesmo ali ao lado, entram e saem cegos à mudança que galopa.
Onde está a ligação ao quotidiano? ao trabalho? às empresas? às profissões?
O que têm feito ao longo destes trinta e tal anos senhores professores?
Moldaram ninguém.
Empreenderam nada.
Ensinaram inutilidades.
Veicularam o stablishment.
Quase todos quiseram saber só de vós e dos vossos.
Acantonaram-se no vosso mundo protegido, confortável, de servente público e só reagiram quando exigiram de vós mais.

António

José Batista disse...

Do De Rerum vim até aqui.
A meu ver, o "post" retrata a situação que se vive.
E, não fossem os professores e a sua persistência, com a colaboração dos pais que estão em condições de educar os filhos, nem a baixa percentagem de bons alunos que ainda conseguimos ter seria tão bem preparada.
Como professor, e como tantos colegas, luto para que esses casos de sucesso continuem a ser um motivo de ânimo e de esperança.

Sara Raposo disse...

António,
Julgo que deveria justificar algumas das afirmações que faz, pois constituem generalizações grosseiras e injustas.

Seguidamente, vou explicar porquê.
Os professores ensinam nas escolas não o que entendem ser o melhor ou o mais correto, mas os programas curriculares das várias disciplinas aprovados pelo ministério da educação. É verdade que alguns programas deveriam ser repensados e a estrutura de alguns dos cursos existentes também, nomeadamente profissionais, que deveriam centrar-se mais na preparação dos alunos para a vida ativa. Todavia, isso não significa que os professores de hoje sejam “fracos”, “tenham parado no tempo” ou que não ensinem a pensar como afirma. Está enganado, se consultar o trabalho que eu e o meu colega desenvolvemos neste blogue pode perceber porquê.

Na educação, como em todas as profissões, há bons e maus profissionais (como há bons e maus alunos): há os que investem, se atualizam científica e pedagogicamente, dão boas aulas e conseguem levar alguns alunos a aprender e há os que não o fazem. Conhece alguma profissão em que isso não aconteça? Sobre outras profissões mais técnicas, a maioria das pessoas não se atreve a opinar porque não tem conhecimentos, em relação à docência todos acham que podem dizem alguma coisa, mesmo que não saibam do que estão a falar e não tenham dados para o fazer, como me parece ser o seu caso.

Conhece alguma alternativa à escola? Pode-se aprender de outro modo?

Conhece alguma profissão em que o trabalho esteja tão exposto publicamente, à crítica e à discussão por toda a gente (mesmo aqueles que não sabem do que falam)?

Confundir o ressentimento que tem em relação aos funcionários públicos em geral com o ressentimento aos professores não é correto. Informou-se das condições de trabalho, do número de horas que os professores têm de trabalhar em casa, para além das horas que tem no seu horário semanal e do tipo de trabalho que lhes é exigido?

Neste momento o ensino é uma profissão desgastante, mal paga e sem grandes compensações, sobretudo, no que seria mais importante, ao nível do empenho dos alunos, pois a maior parte deles não está interessada em aprender (como se pode comprovar pelos resultados obtidos nos exames nacionais e em estudos internacionais credíveis).

Ao contrário do que diz, a contestação dos professores não se relacionou com terem exigido “mais” aos professores (já agora, “mais” significa o quê?), mas com o facto de lhes terem exigido que se submetessem a um sistema de avaliação sem rigor e objetividade (que na verdade promovia o compadrio, os amigos os amigos) e não permitia reconhecer o mérito daqueles que sempre trabalharam e continuam a trabalhar.

Cumprimentos.

Sara Raposo disse...

José,

Agradeço o seu comentário. Reconheço que é devido a uma grande dose de altruísmo de alguns professores e encarregados de educação, nalguns casos, que alguns alunos conseguem ter sucesso. Penso até que o ministério conta já com isso e por nos dá, por exemplo, no horário apenas um tempo reduzido para exercer cargos fundamentais como a direção de turma. Só que não devia ser assim, não devia ser necessário um professor sacrificar muitas vezes a sua vida familiar e pessoal para compensar as péssimas condições de trabalho que tem. A desvalorização da classe docente não é só da sociedade em geral, que não preza o conhecimento, é também do próprio ministério que não nos dá condições para exercermos de uma forma mais digna a profissão (dando por exemplo mais tempo para investir no estudo e na preparação das aulas e menos na concretização das tarefas burocráticas).

Cumprimentos.

Anónimo disse...

Sara, apenas pequei pela generalização. Claro que não são todos. É óbvio.
Apenas reagi à forte adjectivação do post.
E, também, creia que estou mais bem informado do que pensa. A minha experiencia enquanto aluno e três filhos a passar pela escola não me dão conhecimento?
Essa postura altaneira, a roçar o arrogante, é mesmo aquilo que encontramos - salvo honrosas excepções - sempre que voltamos à escola. Esse pequeno reino que custa a partilhar... mas vai ter de ser aos poucos, não é verdade?
E sobre os maus professores, o que fazer com eles?
E diz bem o José, ...não fosse os pais em condições... (e os bons professores, claro).
Cumprimentos

sem-se-ver disse...

"A minha experiencia enquanto aluno e três filhos a passar pela escola não me dão conhecimento?"

não.

:)