Estreou, recentemente nos cinemas portugueses, um filme baseado na história da modelo somali Waris Dirie, chamado Flor do deserto. Waris Dirie nasceu numa família nómada da Somália e foi submetida a uma prática imoral, mas vulgar no seu país e em vários outros, chamada mutilação genital feminina ou excisão. Mais tarde, quando se tornou conhecida internacionalmente, escreveu um livro e tornou-se uma activista contra essa tradição cultural.
Este testemunho mostra-nos como o respeito pela diversidade cultural de um povo não pode confundir-se, como é frequente, com a defesa do relativismo cultural. Assim, se admitíssemos um dos pressupostos fundamentais desta teoria: o que é moralmente certo ou errado depende dos padrões culturais aprovados pela maioria das pessoas pertencentes a uma determinada sociedade, ficaríamos impedidos de considerar que, do ponto de vista racional, esta é uma prática absurda que viola alguns dos direitos humanos fundamentais.
Portanto, nem todos os valores morais são relativos, nem todas as tradições culturais são respeitáveis. Ou não?
5 comentários:
Oi. Estou montando meu TCC sobre o mito da liberdade feminina da mulher contemporânea, um estudo sobre a obra filosofica de Simone de Beauvoir...e a dica deste filme me é muito pertinente...
Obrigada!
Excelente dica de filme! Eu já sabia da existência do livro e um pouco da vida da modelo, embora não tenho o lido. Um abraço
Obrigado a ambas pelos vossos comentários.
Olá, estou visitando o blog pela primeira vez. Achei pertinente o tema, também por já ter participado de alguma discussão relacionada. O costume são práticas humanas que, por algum motivo, positivo ou negativo, se reiteram na história de uma sociedade. A relativização da cultura e, por conseguinte, das leis, da moral e do costume que pertencem a determinado povo, muitas vezes serve para que sejam conservados valores desumanos entranhados no seio dessas sociedades. Não quer dizer isso que há culturas superiores ou culturas inferiores no planeta, e nenhuma nação tem direito de impor suas leis a outra. O que acontece é que, do ponto de vista dos direitos humanos, deve-se analisar a quem servem tais práticas, quem sofre, no caso em comento, com elas. Sendo assim, a excisão genital feminina é um costume que deve ser combatido, e principalmente pelas mulheres que sofrem com essa prática. Porque a elas deve pertencer a liberdade sobre seus próprios corpos.
Ruiz:
A defesa do relativismo cultural pode ser e é, muitas vezes, uma forma de ocultar a violação de direitos humanos fundamentais, em particular das mulheres. Veja-se por exemplo países como a Arábia Saudita e o Afeganistão, onde as tradições religiosas, por exemplo, impedem as mulheres de ter direitos fundamentais quer na sua vida privada quer profissional. Para as mulheres que vivem nestas sociedades é difícil, por vezes, ter consciência dos seus próprios direitos e reivindicar uma alteração dos costumes. Esta última teria de passar pela educação e o acesso a modelos sociais diferentes dos que se encontram instituídos.
Disse no seu comentário o seguinte: "Não quer dizer isso que há culturas superiores ou culturas inferiores no planeta, e nenhuma nação tem direito de impor suas leis a outra". A defesa do etnocentrismo não faz sentido, concordo consigo. No entanto, há certas práticas culturais que
que são moralmente erradas e portanto, de facto, devem ser condenadas em nome de valores universais que respeitem a dignidade das pessoas, independentemente da cultura a que estas pertençam. Dizer que certos hábitos culturais estão errados e deviam acabar não significa pôr em causa a totalidade da cultura de um povo ou desrespeitá-lo, considerando-o inferior. O que importa é a justificação racional apresentada.
Considera possível conciliar a defesa de valores universais (como os direitos humanos) como o relativismo cultural?
Cumprimentos.
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