QUE QUER DIZER TUDO ISTO? Uma iniciação à filosofia, de Thomas Nagel, editado pela Gradiva, é uma excelente introdução à filosofia. Trata-se de um livro pequeno, constituído por 9 capítulos independentes, cada um deles contendo um breve ensaio sobre um problema filosófico diferente. Por exemplo: “Como sabemos seja o que for?”, “Livre-arbítrio”, “Certo e errado”, “O sentido da vida”, etc.
Thomas Nagel escreve de modo muito claro e sem pressupor conhecimentos prévios do leitor, pelo que pode ser compreendido por pessoas que nunca estudaram filosofia. Em cada um dos ensaios, Nagel formula com brevidade, embora de modo rigoroso, o problema em causa, e depois analisa várias respostas possíveis, discutindo os seus pontos fortes e fracos e comparando argumentos e contra-argumentos. Ao escrever dirige-se directamente ao leitor, como se estivesse a debater o assunto com ele. Ou seja: procura que o leitor ao lê-lo comece a filosofar.
Vejamos um excerto do capítulo “Outras mentes”:
“Que sabes realmente sobre aquilo que se passa na mente de qualquer outra pessoa? É claro que só observas os corpos de outras criaturas, incluindo os das pessoas. Observas aquilo que fazem, escutas aquilo que dizem e os outros sons que produzem, vês como respondem ao ambiente que as rodeia – quais as coisas que as atraem e quais as que lhe repugnam, aquilo que comem, e assim sucessivamente. Também podes abrir outras criaturas, observar o interior dos seus corpos e comparar mesmo a sua anatomia com a tua.
Mas nada disto te dará um acesso directo às suas experiências, pensamentos e sentimentos. As únicas experiências que podes realmente ter são as tuas próprias: se acreditas em alguma coisa acerca da vida mental de outras pessoas, só fazes com base na observação da sua constituição física e dos seus comportamentos.
Tomemos um exemplo simples: quando comes gelado de chocolate com um amigo, como sabes que o teu gelado e o do teu amigo têm o mesmo sabor para ele e para ti? Podes provar o gelado dele, mas o facto de ter o mesmo sabor que o teu apenas quer dizer que para ti o sabor é o mesmo: não tiveste nenhuma experiência do sabor que o gelado tem para ele. (…)
A mesma questão pode ser colocada relativamente a outros tipos de experiências. Como sabes que o teu amigo não vê as coisas vermelhas tal como tu vês as amarelas? É claro que, se lhe perguntares qual é a cor de uma boca-de-incêndio, te responderá que é vermelha, como o sangue, e não amarela, como um dente-de-leão, mas isso acontece porque ele, tal como tu, usa a palavra vermelho para a cor que vê nas bocas-de-incêndio e no sangue, seja qual for essa cor. Talvez seja a cor a que chamas azul, até mesmo uma cor que nunca viste e que nem sequer podes imaginar. (…)
Se continuarmos a seguir este caminho, seremos finalmente conduzidos ao mais radical dos cepticismos acerca das outras mentes. Como sabes que o teu amigo é consciente? Como sabes que há outras mentes para além da tua?
O único exemplo que já observaste de uma correlação entre mente, comportamento, anatomia e condições físicas é o teu. Mesmo que as outras pessoas e animais não tivessem quaisquer experiências, nem vida mental interna de qualquer tipo, mas fossem apenas máquinas biológicas elaboradas, teriam para ti precisamente a mesma aparência. Portanto, como sabes que não são assim de facto? Como sabes que os seres que te rodeiam não passam de robots sem mente?”
Thomas Nagel, O que quer dizer tudo isto? - Uma iniciação à Filosofia, Gradiva, Lisboa, 1995, pp. 22-26.
(Se clicar no nome do livro poderá obter mais informações úteis acerca dele.)
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