segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Tabelas de verdade

Para construir tabelas de verdade online, ver aqui.

O vídeo inicial contém algumas imprecisões conceptuais, a este propósito ver os comentários do leitor Aires Almeida (a quem agradeço) e os meus.

6 comentários:

Aires Almeida disse...

Olá, Sara. Mais uma vez, parabéns por este excelente blogue. Tenho contudo muitas reservas quanto ao vídeo que aqui apresentas, pois acho que contém várias imprecisões e é didacticamente infeliz:

1. A explicação do que é uma proposição não é esclarecedora e é até incorrecta. O que o autor diz pode aplicar-se a frases que não exprimem proposições, como é o caso das interrogativas.

2. O autor fala do valor lógico das proposições, mas ninguém sabe bem o que é isso. O que ele refere é o valor de verdade. Uma proposição simples ser verdadeira ou não, não é uma questão lógica. A não ser no caso das verdades lógicas (tautologias, por exemplo).

3. O autor chega a dizer, a propósito da condicional, que uma proposição pode não ser completamente verdadeira. Isso é um disparate: uma proposição ou é verdadeira ou é falsa e nada mais.

4. A explicação do funcionamento semântico de cada operador ou conectiva, é muito deficiente.

Enfim, acho pouco esclarecedor e até lança alguma confusão conceptual. Mas posso estar enganado, claro.

Aires Almeida disse...

Nunca é de mais reforçar os parabéns à Sara e ao Carlos por este excelente blogue.

Tenho, contudo, de manifestar as minhas reservas em relação a este vídeo sobre as tabelas de verdade. Isto porque me parece muito infeliz, na medida em que contém vários erros, além de o achar didacticamente confuso.

Eis alguns exemplos:

1. A explicação que o autor dá, logo de início, do que é uma proposição é incorrecta e pouco esclarecedora. Quase tudo o que ele diz caracterizar as proposições se aplica também a frases que não exprimem proposições, como as interrogativas.

2. Fala do valor lógico das proposições quando devia falar do seu valor de verdade. Uma proposição simples ser verdadeira ou falsa nada tem que ver com o suposto valor lógico, coisa que, de resto, ninguém sabe bem o que é.

3. Sugere, quando explica a semântica da condicional, que há proposições que são parcial e totalmente verdadeiras, o que é um disparate.

4. A explicação do funcionamento semântico das conectivas é confusa e baseada em exemplos duvidosos.

E há ainda outros pormenores. Mas posso estar enganado, claro. O que vos parece?

Sara Raposo disse...

Olá Aires,

Agradeço a tua atenção e a tua preocupação com os aspetos didáticos e o rigor concetual da informação que disponibilizo neste blogue e, portanto, as considerações que fizeste nos teus comentários. Quanto a estas tenho a dizer o seguinte:

1º O vídeo foi colocado no blogue depois de já terem sido explicados nas aulas os conteúdos programáticos relacionados com as proposições e os operadores verofuncionais (só não tinha sido dada a bicondicional). O contexto da sua utilização foi este: depois de perceber que - após a correção da 1ª ficha de avaliação e o 1º teste realizado - alguns alunos (uma minoria, felizmente) continuavam sem saber o mais elementar: as tabelas de verdade, sugeri-lhes que também podiam utilizar, como um meio alternativo, os vídeos do youtube para visionar as tabelas de verdade, memorizar e tentar de novo compreender. A escolha deste vídeo deveu-se ao facto dos símbolos utilizados serem os mesmos que os do manual adotado, ao contrário do que acontecia em muitos outros vídeos. Reconheço que por ser este o meu objetivo não dei grande atenção às explicações dadas pelo autor do vídeo, pois eu já tinha explicado aos alunos e analisado exemplos nas aulas. Portanto, não utilizei o vídeo propriamente para esclarecer os alunos nem pretendi que as explicações dadas pelo autor do vídeo substituíssem aquelas que já tinha dado nas aulas. Tal como poderás verificar consultando a matriz do teste e o teste de avaliação (no post seguinte) que realizei (antes de disponibilizar este vídeo). Penso que os materiais disponibilizados neste blogue devem ser utilizados criticamente em termos didáticos. Ainda assim, reconheço que a minha falta de tempo e de atenção não justificam o facto de não ter escrito uma nota alertando para a existência de algumas imprecisões e falta de clareza nas explicações apresentadas pelo autor do vídeo.

Sara Raposo disse...

(continuação do comentário anterior)

2ºQuanto as observações que fizeste:

- É verdade que na explicação dada a distinção entre proposição e frase não é clara. Não é dito explicitamente que as proposições correspondem ao pensamento que se expressa apenas através de certas frases (das declarativas) e quais são as razões que nos levam a considerar que existam outras frases que não exprimem proposições. É verdade que o que é dito se aplica também a frases que não expressam proposições.

- Quanto à utilização do conceito “valor lógico” em vez de “valor de verdade” pelo autor do vídeo. Em Portugal nós utilizamos a expressão “valor de verdade”, mas substituir esta palavra por “valor lógico” (como faz o autor do vídeo no Brasil) levanta exatamente que tipo de problemas? Quais são as desvantagens de utilizar o termo “valor lógico”? Estes termos podem ser também utilizados como equivalentes, eu consultei o artigo “lógica polivalente” (da pp. 445-446 da Enciclopédia de termos lógico-filosóficos da Gradiva, da autoria de A. J. Franco de Oliveira) e neste utiliza-se valor lógico como sinónimo de valor de verdade – “A suposição de que, sob cada interpretação, toda a proposição é verdadeira ou falsa está na base da lógica clássica, proposicional e quantificacional. Um passo natural na generalização da lógica bivalente é a introdução de mais valores lógicos além dos clássicos verdade ou falsidade. A possibilidade de um terceiro valor lógico…”. Assim, tu dizes que “ninguém sabe bem o que é isso do valor lógico”. Eu não percebo o que queres dizer com essa afirmação, mas talvez me possas elucidar.

- Em relação ao que dizes sobre a condicional, a interpretação e as consequências retiradas do que o autor do vídeo diz parecem-me um pouco exageradas. Ao explicar a circunstância em que a antecedente é verdadeira e a consequente é verdadeira ele diz algo como “o valor lógico da proposição é TOTALMENTE verdadeiro”. Mas depois ao explicar as outras duas circunstâncias em que a condicional é verdadeira não diz que nesses casos esta não é completamente verdadeira. Por isso, a referida utilização da palavra “totalmente” foi apenas um coloquialismo.

Penso que um dos problemas é o facto dele não explicitar, ao falar, a distinção entre proposição simples e composta, distinguindo o valor de verdade da antecedente e da consequente do valor de verdade da condicional, embora esta distinção esteja subentendida.

Por último, desculpa não te respondido antes, mas as minhas condições (de trabalho e pessoais)não o permitiram.

Cumprimentos.

Aires Almeida disse...

Sara, antes de mais, deixa-me dizer que os meus dois comentários se repetem. Pensei que tinha havido um problema com o primeiro e que não te tinha chegado, pelo que enviei o segundo, praticamente igual ao anterior.

Gostaria também de dizer que tenho boas razões para pensar que as tuas aulas são muito mais claras e rigorosas do que encontramos no vídeo que sugeriste. Sucede que, como referes, às vezes indicamos materiais didácticos disponíveis na net que são menos esclarecedores do que nós próprios sabemos fazer. Acontece-nos a todos. Não há, pois, grande problema nisso.

Mas acho que vale a pena chamar a atenção para eventuais infelicidades, pois só assim podemos evitar futuros erros e confusões.

Quanto à noção de valor lógico, acho que artigo do matemático Franco de Oliveira assenta numa tradução infeliz de "truth value" ou então numa generalização abusiva, ou numa mistura de ambas, como tentarei mostrar mais à frente. Acho, portanto, que está enganado, apesar de reconhecer que FA sabe muitíssimo mais de lógica do que eu. Até poderia tratar-se de um bom argumento de autoridade, mas não é. Basta consultar as mais importantes e reconhecidas introduções à lógica, como as de Copi, Forbes, Restall, etc. para se verificar (numa simples consulta ao índice analítico) que nenhuma delas fala de valor lógico. Nem no clássico de história da lógica de W. e M. Kneale se fala de valores lógicos no sentido de valores de verdade. E porquê?

Bom, pensa na proposição expressa pela frase "A relva é verde". Esta proposição é verdadeira. Mas o que nos permite afirmar que a proposição é verdadeira? A lógica? Não, não é uma questão lógica a proposição ser verdadeira ou falsa, mas a nossa observação de que a relva é verde (contam mais os olhos do que a lógica!). Assim, dizer que o valor de verdade de uma proposição é o mesmo que o seu valor lógico assenta numa confusão que não serve de nada.

Muito provavelmente, a confusão de Franco de Oliveira assenta, como disse, numa generalização incorrecta. Estará certamente a pensar no seguinte: sabemos que proposições com a forma lógica "Se A, então B" e "Não A ou B" são logicamente equivalentes, concluindo que têm o mesmo valor lógico, o que até se entende. Neste caso, duas proposições terem o mesmo valor lógico seria o mesmo que serem logicamente equivalentes. O problema é que ele não pode dizer isso de todas as proposições e, muito menos, de proposições simples (ou atómicas). Além disso, está a exprimir uma ideia diferente do facto de elas serem verdadeiras ou falsas.

Quando se fala na lógica bivalente, estamos a pensar, grosso modo, na lógica clássica, que parte do princípio que as afirmações são verdadeiras ou falsas, mas não ambas nem mais do que isso. Mas nas lógicas que não assentam no princípio da bivalência e que admitem outros valores (lógicas multivalentes) talvez se justifique falar desses valores como valores lógicos (não sei, o meu conhecimento nessa matéria é muito básico).

Em suma, do que está a falar mesmo quando se fazem tabelas de verdade é de valores de verdade. Falar de valores lógicos é abusivo e confuso. Por isso não se encontra em nenhum bom manual de lógica clássica qualquer referência a valores lógicos, apesar de Franco de Oliveira.

Quanto aos coloquialismos, não vejo mal algum, a não ser que possam induzir em erro em questões centrais ao que se está a ensinar, como foi o caso do autor do vídeo.

Mas ninguém está livre de errar. Olha, estou frequentemente a deparar-me com erros e infelicidades no manual de que sou co-autor, incluindo na parte da lógica. Aliás, tenho a ideia que o Arte de Pensar é, talvez, dos poucos manuais que têm erros.

Continuação do bom trabalho.

Sara Raposo disse...

Olá Aires,

Agradeço a tua resposta. Em relação à questão do valor lógico: penso que tens razão quanto às explicações que te deste ao trabalho de apresentar.

Em relação à capacidade de reconhecer erros, como já deves ter notado, eu não tenho problema em fazê-lo publicamente e até agradeço a quem é capaz de os apontar. Contudo, não deixo de dizer o que penso.

Cumprimentos.
E continuação de um bom trabalho também para ti.