Há uma palavra proibida quando se fala de educação: inteligência. Os professores nunca recorrem, pelo menos em voz alta, a explicações deste género: “O aluno X teve notas muito baixas porque é pouco inteligente”. Os especialistas em educação e os políticos que nela mandam, ao explicar o sucesso e o insucesso escolares referem as causas mais díspares (as estratégias utilizadas pelos professores, a gestão das escolas, o tamanho das escolas e das turmas, o ambiente familiar, etc.), mas nunca a inteligência dos alunos. E muito menos a falta dela!
É estranho que assim seja, pois a existência e a influência da inteligência no comportamento e na aprendizagem parecem indesmentíveis. Tal como o facto de esta ser uma questão de grau e de haver pessoas mais inteligentes que outras.
Se bem me lembro de algumas leituras de Psicologia, os psicólogos não descobriram que a inteligência não existe, mas sim que é difícil de medir com rigor e que não é provavelmente uma capacidade única, sendo composta por várias aptidões diferentes (podendo uma pessoa inteligente na matemática, por exemplo, não o ser noutras áreas). Essas descobertas deviam, quanto muito, levar-nos a não confundir o célebre QI (os resultados obtidos nos testes) com a inteligência efectiva da pessoa e, talvez, a falar de ‘inteligências’, no plural, mas não a banir a palavra e o conceito.
Sendo assim, porque é que a palavra ‘inteligência’ nunca aparece nos discursos sobre a educação?
14 comentários:
Talvez, os alunos até sejam inteligentes... só demonstrem, na realidade, falta de estudo!
Excelente texto, mas a verdade é que às vezes a palavra inteligência não é proibida, que é quando se diz que tem que passar a ser proibida.
Passo a explicar com um exemplo. Lembro-me que no meu 8º ou 9º ano uma professora, na primeira aula, começou logo por dizer que não acredita nisso da inteligência e que acha que todos têm iguais capacidades, sendo que tudo dependerá do esforço de cada um.
Há um excelente livro de Steven Pinker intitulado "The Blank Slate" que, depois de explicar como a mente funciona (e, em particular, que a inteligência de facto existe), tenta chegar a uma conclusão sobre porque é que, se está de facto provado pela ciência e pela psicologia cognitiva moderna que é um facto que há pessoas mais inteligentes que outras, então porque é que há quem continue a dizer o contrário.
Pinker argumenta então que estas insistências sem sentido se devem a vários medos. Talvez o medo mais importante seja o medo de que, por causa disso, a igualdade esteja em causa. Em seguida, o autor explicar porque é que não está.
Um livro muito interessante que todos os que continuam a querer banir a palavra inteligência do dicionário deveriam ler.
É verdade que na educação, fala-se pouco ou nada de inteligência, porque aplicar as teorias psicológicas da inteligência seria uma revolução. Outro paradigma. Para lhe dar uma ideia, o psicólogo Robert Sternberg, um dos mais recentes investigadores na área da inteligência, na sua teoria , representa a inteligência humana por três formas (triárquica) diferentes: Inteligência Analítica ou Convencional, Inteligência Criativa e a Inteligência Prática. Assim, são competências analíticas (Analisar, criticar, avaliar, comparar); São competências criativas (criar, inventar, descobrir, imaginar e supor); São competências práticas (implementar, usar, aplicar de modo relevante). Eu concordo com a crítica que Sternberg faz à escola – a escola investe quase exclusivamente nas competências analíticas. Depois surpreendem-se quando os alunos vão para o mundo do trabalho e não sabem resolver problemas pouco definidos e... não sabem ser práticos…E mais, ele diz que se deve proporcionar a cada um dos alunos "a educação que melhor se adequa e aos que se distinguem numa determinada área oferecer-lhe o desafio suplementar com vista a ir mais longe"
Se lhe interessar:
"Inteligência de Sucesso”
Robert Sternberg
Editora: Ésquilo
Talvez por que a inteligência não seja merecida. Só se merece o que for conquistado.
Caia:
Há de tudo, naturalmente: muito inteligentes, pouco inteligentes, etc. E há uns que estudam muito, outros que estudam pouco e outros que não estudam nada.
Mas não é por isso que a palavra não é usada.
Miguel:
Não conheço o livro, mas concordo com as ideias referidas. Também me parece que a causa é o medo de que valorizar a inteligência promova a desigualdade. O que é uma tolice, mas...
Claro que reconhecer o papel da inteligência não implica desvalorizar outros factores, como por exemplo o empenho e o exercício.
António:
Não é uma questão de merecimento ou desmerecimento. É uma questão factual: a inteligência tem um papel muito importante na aprendizagem, pelo que não faz sentido que os educadores o omitam.
Cristina Simões:
Não conhecia essa teoria de Robert Sternberg. Pelo que sei há diversas teorias sobre a inteligência, nomeadamente sobre a sua composição.
Não sei qual é a teoria correcta, mas julgo que o facto de na educação existir um tabu em relação à inteligência não se deve à influência da teoria X e à ignorância da teoria Y, mas sim ao preconceito - como explicou num comentário o leitor Miguel Galrinho - de que valorizar a inteligência é promover as desigualdades sociais.
Seja como for, julgo que na escola se devem treinar e estimular aptidões muito diferentes - seja qual for o nome que se lhes dê e a teoria que se escolha como enquadramento. Convinha é fazê-lo de modo consciente e reflectido - mas como fazer isso se, à partida, existe uma espécie de proibição para utilizar a palavra 'inteligência'?
O que se verifica, na realidade, é que há pessoas mais inteligentes do que outras. No entanto, as menos podem revelar potencialidades surpreendentes, originais e muito positivas a nível comunitário.
De repente lembrei-me do caso do eminente cientista Albert Einstein.
helena
Prezado Carlos,
Certamente a inteligencia torna-se fator fundamental no aprendizado. Nao considera-la significa ''uniformizar'' as pessoas... nao trata-las como seres individuais.
Porem, acredito que nao se toca muito nesta questao, no que se refere {a educacao, porque ha o temor de ser ''estigmatizante'' diferenciar uns dos outros. Entao, nos vemos diante desta questao - A inteligencia deveria ser considerada na educacao, no entanto nao vale a pena arriscar em diferenciar - formalmente - um aluno do outro.
Abco,
Andrea
Este é um tema que tenho começado a estudar atualmente. Pelo que já li, há muitas críticas a respeito do postulado das inteligências múltiplas, de Gardner, e talvez parte de sua popularidade se deva ao medo que alguns leitores comentaram acima. Se uma criança não é boa em matemática, pode ser que ela seja ótima em português.
E pode ser que isso ocorra mesmo. No entanto pesquisas recentes mostram que o motivo parece não ser a existência de múltiplas inteligências. Pelo contrário, é mais provável que uma criança/adulto boa em matemática também domine o português, e tal covariação permite aos psicólogos deduzirem a existência do fator g, a inteligência geral. Os casos menos frequentes onde o rendimento em uma disciplina não acompanha o rendimento em outras podem, muitas vezes, ser explicados pela influência de outras variáveis, tais como a relação professor-aluno e o método de ensino.
Um abraço!
Talvez porque nao faz parte do trabalho dos agentes da educacao avaliar "inteligencia" ( seja la o que isso for) mas sim ensinar, o que pode ser sempre melhorado ( estratégias utilizadas pelos professores, a gestão das escolas, o tamanho das escolas e das turmas, o ambiente familiar, etc.)
Mas, lembro-me de professoras do meu tempo da secundaria, que se viravam frustradas para as turmas, depois se uma cascata de perguntas sobre uma materia mal compreendida, dizendo "sem ofensa, mas voces sao burros! Nao quero ofender ninguem mas voces sao mesmo burros" Portanto, se e a isto que se refere, tranquilize-se, comentarios sobre a inteligencia nao faltam nas aulas.
Parece-me que a inteligência não é utilizada nestes casos por questões de igualdade de oportunidades. Seguramente que a sua influência é bem real no desempenho dos alunos, mas utiliza-la como justificação poderia ser um grande erro. Tanto por ser de difícil avaliação como pelas limitações que poderia causar e restrições. Devem ser dadas condições mínimas iguais a todos, mas nunca colocar limitações superiores, sendo que assim os "mais inteligentes" nunca se virão limitados.
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