quinta-feira, 8 de julho de 2010

Exame de Filosofia: uma história mal contada

Foram hoje conhecidos os resultados dos exames nacionais. Segundo o jornal Público “foram avaliadas 24 disciplinas”. Mais uma vez, a Filosofia não fez parte do lote. (Nem a Filosofia nem nenhuma das outras disciplinas que os professores de Filosofia muitas vezes leccionam: Sociologia e Psicologia.) Tal facto não aflige a maior parte dos professores de Filosofia que conheço, mas a mim aflige.

Não vislumbro qual possa ser a justificação para essa discriminação. Nunca consegui compreender porque é que o governo anterior acabou com o exame nacional de Filosofia. Inicialmente estava previsto que os alunos no final do 11º, à semelhança do que sucede em disciplinas como Física e Química A e Geografia A, fariam obrigatoriamente um exame de Filosofia, sem o qual a disciplina não ficaria concluída. Depois, o governo decidiu acabar com a obrigatoriedade do exame e mantê-lo como prova específica de acesso à Universidade. O exame foi realizado apenas durante dois anos nessa modalidade, pois o governo decidiu acabar com ele de todo.

Actualmente, um aluno que queira estudar Filosofia na universidade tem de realizar provas específicas de História ou Português. Durante muitos anos, os alunos que pretendiam ingressar nas faculdades de Direito estudavam Filosofia no 12º ano e depois efectuavam o respectivo exame nacional, que entretanto também acabou. Actualmente, os futuros advogados em vez de um exame de Filosofia podem fazer provas de Português ou mesmo Inglês. Não será isso absurdo?

Nunca foi bem explicado porque é que o exame de Filosofia acabou. Trata-se de uma história muito mal contada. Infelizmente, em Portugal as histórias mal contadas acabam por nunca ser bem contadas - nem mesmo pela História.

6 comentários:

Helena Serrão disse...

Ora aí está uma matéria que também podia ser aflorada nos encontros de Filosofia. Porque não há exame nacional de 11ºAno? Porque não é a Filosofia uma disciplina obrigatória nos Cursos de Humanidades?

Sara Raposo disse...

Olá:

Não sei dizer ao certo qual é o local apropriado para discutir a questão. A Filosofia já é uma disciplina obrigatória (na formação geral) no 10 º e 11º ano dos cursos de Humanidades e existe também como uma opção (Filosofia A) para os alunos que frequentam o 12º ano destes cursos.

Parece-me que o problema principal em relação a existência ou não de exame de Filosofia é o facto da maioria dos professores que leccionam a disciplina não terem nada a dizer sobre este assunto. Aliás, no passado, quando o exame existiu e foi realizado exclusivamente como prova de acesso, também não houve nunca uma posição pública por parte dos professores. Estes aceitaram passivamente a extinção do exame, como já tinham aceitado a trapalhada que foi a sua implementação. Como professora recordo-me de ter recebido, no ano lectivo em que exame se realizou pela primeira, diferentes directrizes do Ministério da Educação: no final do ano lectivo, este tinha deixado de ter o peso de 30% na classificação final desta disciplina (como acontecia em todas as outras disciplinas sujeitas a exame nacional) e passou a contar apenas como prova de acesso para vários cursos universitários (que eram na altura muitos). Progressivamente as universidades mudaram as suas provas de acesso e o exame de Filosofia foi extinto. Porquê?

Nunca foi dada publicamente, pelo Ministério, qualquer tipo de explicação aos professores. Mas, se calhar, também é verdade que a maioria destes nunca a exigiu e limitou-se, pelo que pude observar, a respirar de alívio quando o exame foi extinto.

É curioso que os responsáveis (na área da Filosofia) pela implementação do exame não terem sentido a necessidade de explicar publicamente estas alterações (supondo que o fizeram, a sua divulgação não foi feita nas escolas secundárias juntos dos professores, pelo menos eu não tive disso conhecimento oficial, embora tivesse indagado diversas vezes os responsáveis da escola). Que balanço foi efectuado, das classificações obtidas pelos alunos? Algo correu menos bem em todo este processo: porquê e devido a quem?

A ironia das ironias: a Filosofia é uma disciplina em que, supostamente, se promove a reflexão e a atitude crítica. Então, que havemos de pensar do exercício que a maioria dos professores de Filosofia faz do pensamento crítico?

Pela minha parte, julgo que a não existência de exame nacional contribui bastante para o desprestígio da disciplina (que fica assim sem um meio de avaliar a qualidade das aprendizagens dos alunos). A extinção do exame, perante a passividade da maioria dos professores de Filosofia, significou “dar tiros nos próprios pés”, como se irá observar no futuro quando forem introduzidas alterações no currículo dos alunos.

Cumprimentos.

Doce Cozinha disse...

Ainda tive de fazer o exame nacional de acesso ao ensino superior de Filosofia, não sabia que tinha acabado!

Carlos Pires disse...

Carlos e Helena:

Talvez não fosse má ideia os professores de Filosofia reflectirem alargadamente acerca do seu ensino, nomeadamente acerca dos exames. Num Encontro Nacional ou noutra circunstância. Mas a maioria dos que eu conheço não parece nada interessada em discutir isso. Felizmente conheço poucos! -:)

Carlos Pires disse...

Sara:

Boas perguntas! Ora, as boas perguntas merecem boas respostas. Ou pelo menos respostas.

Carlos Pires disse...

Caia:

Acabou, infelizmente.