O jornal “Expresso” publicou ontem um ranking interativo das escolas - que pode ser consultado AQUI - e onde o leitor poderá ver a posição em que ficou cada escola. A imagem anterior refere-se ao distrito de Faro. Além das médias obtidas nos exames de Português, Física e Química, Biologia e Geologia e Matemática, disponibilizam-se outros dados pertinentes a que vale a pena dar atenção, como por exemplo: “a percentagem de alunos carenciados” e o “número de provas realizadas”.
O ranking apresentado, independentemente de se concordar ou não com a sua publicitação (e eu sou a favor), foi elaborado segundo critérios discutíveis, nomeadamente o facto de se considerarem só as classificações obtidas nos exames nacionais das disciplinas de Português, Física e Química, Biologia e Geologia e Matemática. Veja-se o quadro seguinte:
Porquê privilegiar as disciplinas específicas dos cursos de ciências (Física e Química, Biologia e Geologia e Matemática) em detrimento dos cursos de humanidades?
A "média da escola”, que determina a sua posição no ranking, é calculada a partir dos resultados dos exames de quatro disciplinas, mas é apresentada como sendo “da escola”. No caso do ensino secundário, é preciso dizer que isto é uma fraude. A média da escola, para ser verdadeira, teria de considerar todos os exames nacionais realizados, o que não acontece. Os alunos do secundário fazem exames nacionais de Filosofia, de História A, de Espanhol, de Geografia, entre vários outros. Contudo, as classificações destes não são consideradas no ranking. E porquê? Que critério foi utilizado?
Se for as disciplinas com maior número de inscrições nos exames a nível nacional (como julgo que é), então é preciso dizer que o ranking é só dessas disciplinas e não das escolas. Mas mesmo considerando apenas esse redutor critério numérico, está a ser esquecido o facto de o número de inscritos em Filosofia ter vindo a subir de ano para ano (em 2014 fizeram exame 11.513 alunos, dos quais 7.956 eram internos).
Na realidade, “as médias das escolas”, vindas agora a público, não são as mesmas que o ministério da educação considera nas suas estatísticas, pois estas englobam a média obtida na totalidade dos exames. E isso, além de deturpar a verdade, é injusto. No caso da disciplina de que posso falar - Filosofia - no ano passado a escola Pinheiro e Rosa foi a escola do Algarve (apesar do número de alunos e de turmas ser menor do que de várias outras) onde mais alunos internos realizaram o exame nacional de Filosofia e a média, à semelhança de anos anteriores, foi positiva (a diferença entre a média das classificações internas que atribuí, 13,41, e a média da classificação interna obtida no exame pelos alunos internos foi de 2,38 valores. A média total das classificações dos alunos internos da escola foi de 10.92, ver dados AQUI e AQUI).
Porque não haveriam estas classificações ser tidas em conta no ranking? Como se explica que em certas escolas, com um número muito maior de alunos, apenas três ou quatro tenham realizado o exame de Filosofia e nesta escola isso não aconteça? Porque é que a Filosofia, ou outra disciplina com exame nacional, haveria de ficar de fora quando se trata de fazer o apuramento da média da escola?
É um absurdo que assim seja. Contudo, os jornalistas do Expresso fazem passar para a opinião pública a ideia de que “a média das escolas” é objetiva e transparente. Não é, é antes uma fraude.
Mas há, sem dúvida, um efeito perverso nesta fraude (e que a maioria das pessoas conhece bem): na hora dos alunos e encarregados de educação escolherem a escola, um dos fatores relevantes - entre vários outros - a ter em conta é o lugar ocupado no ranking por essa escola. E isso atrai ou afugenta a inscrição de alunos nesse estabelecimento de ensino. Assim, é bom termos consciência de que a imagem pública veiculada nos jornais poderá condicionar, pelo menos em parte, o futuro de uma escola.
Por isso, é inadmissível que se penalize a imagem pública das escolas devido ao desempenho dos alunos apenas em algumas disciplinas e se ignore o bom trabalho que possa ter sido feito noutras.
2 comentários:
Não há fraude. Se a Sara der uma vista de olhos pelo ranking do jornal Público ( feito com base nos resultados das 8 disciplinas com mais alunos inscritos a nível nacional, entre as quais se encontra a Filosofia) apercebe-se que a média da sua escola é de 10.05 (correspondente a 302 provas). Ora os resultados do expresso referem-se a 321 provas com uma média de 10,07.
A opção pela divulgação dos resultados de 4 disciplinas terá a ver ( presumo) com questões de "espaço" e respeitará (provavelmente) critérios semelhantes aos que presidem à opção pelas 8 disciplinas. Em anos anteriores o Público, seguindo o mesmo critério no que respeita à elaboração do ranking apenas tratava em termos mais detalhados, na sua edição em papel, as 4 disciplinas que surgem no site do Expresso.
A justiça no acesso à educação é uma das questões que, na condição de professor do ensino secundário, mais me preocupam.
Durante muitos anos acreditei nos exames nacionais do ensino secundário como instrumento de promoção dessa justiça e bati-me pela sua generalização. Há algum tempo a esta parte venho-me apercebendo que eles se vêm tornando um instrumento de manipulação e injustiça. As condições em que são realizados os exames e o tratamento dado aos seus resultados são hoje um problema e não uma solução.
Alguns dados reveladores disso foram já expostos em estudos. Como exemplos dos dados já divulgados remeto para os artigos http://expresso.sapo.pt/estudo-mostra-que-colegios-inflacionam-notas=f868155 e http://www.jn.pt/PaginaInicial/Sociedade/Educacao/Interior.aspx?content_id=4360191
Além dos problemas referidos nos artigos, outros há que lançam mais suspeitas sobre a justiça do atual sistema: 1) quem garante a seriedade na realização dos exames? 2) quem garante a seriedade na lecionação e na avaliação das disciplinas de opção do 12º ano e, em geral, nas disciplinas não sujeitas a exame?
O 1º problema mencionado acima refere-se à possibilidade de as escolas em que a direção tem grande capacidade de persuasão sobre os docentes vigilantes dos exames (leia-se grande capacidade de pressão e até chantagem, incluindo a ameaça com o desemprego) poderem com isso criar condições para a fraude («copianço») durante as provas. Isto, como é evidente, acontece sobretudo nos colégios privados. Tenho relatos de alunos que os frequentaram e que me alertaram para este grave atropelo ao igual direito à educação.
O 2º problema mencionado acima refere-se à tendência seguida por muitas escolas e professores para praticarem uma espécie de política do eucalipto, ou seja, fazerem das disciplinas de exame as únicas a merecerem trabalho exigente e até reforço de meios, secundarizando as demais disciplinas do currículo, na condição porém de reduzirem o grau de aprofundamento dos conteúdos e baixarem o grau de exigência dos instrumentos de avaliação nestas últimas e, com isso, conseguindo elevados resultados (leia-se médias de disciplina elevadas). Ora, como estas disciplinas têm igual peso no cálculo da média final do ensino secundário, com esta política conseguem melhorar drasticamente as condições de acesso destes alunos ao ensino superior. Compare-se 2 cenários: na escola A os alunos têm de estudar as 5 disciplinas do 12º ano segundo um elevado grau de aprofundamento dos conteúdos e de exigência avaliativa; na escola B apenas as 2 disciplinas de exame têm esse grau de aprofundamento e exigência, podendo os alunos concentrarem-se nelas, pois as altas classificações nas outras 3 disciplinas serão fáceis de conseguir. Naturalmente, alunos com idênticas capacidades e idêntico esforço acabarão por ter muito melhor média na escola B. Estou certo que este problema é um cancro violento que mina atualmente a justiça no acesso ao ensino superior.
A solução tem de passar por serem as Universidades as responsáveis pelas provas de acesso. Assim o problema ficará resolvido, porque o que lhes interessa não são as classificações do secundário, mas os conhecimentos e competências. Fim da batota!
Quanto às escolas secundárias, devem ficar concentradas em educar convenientemente os seus alunos, sendo o seu sucesso medido em função do grau de colocação dos seus alunos nos cursos superiores desejados.
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