terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Uma abordagem literária do problema do livre-arbítrio

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Chigurh - um sinistro assassíno,  personagem principal do romance Este país não é para velhos de Cormac Mc Carthy - antes de eliminar mais uma das suas vítimas oferece-lhe a possibilidade escolher entre a vida e a morte, atirando uma moeda ao ar. Profere, então, o discurso seguinte:

“(…) Não me coube a mim decidir. Cada momento das nossas vidas é uma encruzilhada e é também uma escolha. Fizeste algures uma escolha. Tudo o que veio a seguir conduziu a isto. A contabilidade é rigorosa. A forma está traçada. Não se pode apagar uma só linha. Eu não tinha fé na tua capacidade de mover uma moeda de acordo com os teus desejos. Como seria isso possível? O caminho de uma pessoa neste mundo raramente se altera e é ainda mais raro alterar-se abruptamente. E o traçado do teu caminho era visível desde o princípio.

Ela soluçava. Abanou a cabeça.

E todavia, embora eu te pudesse ter dito de antemão como é que tudo isto iria terminar, achei que não era excessivo proporcionar-te um derradeiro lampejo de esperança neste mundo, para te alegrar o coração antes que tombe o véu, as trevas. Compreendes?

Oh, meu Deus, disse ela. Oh, meu Deus.

Sinto muito.

Ela olhou-o pela derradeira vez. Não és obrigado, disse. Não és. Não és.

Ele abanou a cabeça. Estás a pedir-me que me torne vulnerável, e isso é coisa que eu nunca poderei fazer. Só tenho uma maneira de viver, que não admite casos excepcionais. Uma moeda ao ar no máximo. Sem grande utilidade neste caso. A maioria das pessoas não acredita que possa existir alguém assim. Isso deve constituir para elas um grande problema, como facilmente entenderás. Como levar a melhor sobre uma coisa que nos recusamos a conhecer. Compreendes? Assim que eu entrei na tua vida, a tua vida terminou. Teve um começo, um meio e um fim. O fim é agora. Dirás que as coisas poderiam ter sido diferentes. Que podiam ter corrido de outra maneira. Correram desta. Estás a pedir-me que desminta o mundo. Percebes?

Sim, disse ela, a soluçar. Percebo. A sério que percebo.

Ainda bem, disse ele. Óptimo. Depois deu-lhe um tiro.”

Mas este discurso sobre o livre-arbítrio  poderá ser, de facto, percebido?

Não defenderá Chigurh ideias contraditórias?

Conhecer as teorias filosóficas do determinismo (radical e moderado) e do libertismo poderá ajudar a responder a esta questão.

 

2 comentários:

José Dias disse...

Não entendo muito bem o problema do livre-arbítrio, mas gostei muito desse livro e também do filme.

Sara Raposo disse...

José:
Pode ler uma excelente explicação no post
http://duvida-metodica.blogspot.com/2010/11/formulacao-do-problema-do-livre.html

e nos posts seguintes. Se pretender saber mais, aconselho-o a ler o livro de onde retirei as passagens citadas.

Também gosto bastante do livro e do filme.

Cumprimentos.