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“Dediquei toda a minha vida à luta do povo africano. Tenho lutado contra o domínio dos brancos, tal como tenho lutado contra o domínio dos negros. Sempre defendi o ideal de uma sociedade democrática e livre, em que todas as pessoas possam viver juntas em harmonia e dispor das mesmas oportunidades. É por esse ideal que espero viver para um dia o concretizar. Mas se necessário for, é um ideal pelo qual estou preparado para morrer.” (Excerto do final do discurso que Nelson Mandela proferiu no banco dos réus no julgamento de Rivonia, a 20 de Abril de 1964)
É fácil ter, independentemente das convicções políticas de cada um, uma enorme admiração por Nelson Mandela – o primeiro presidente eleito democraticamente na África do Sul, que esteve preso mais de vinte e sete anos em nome da luta pelos direitos humanos. Se à partida o leitor já possui alguma consciência da grandeza deste homem, quando acabar de ler este livro, estou certa, esta ideia terá sido reforçada.
Os diferentes textos que fazem parte do “Arquivo íntimo” não foram escritos com o intuito de serem publicados em livro. São cartas, entrevistas, notas (em agendas e blocos de apontamentos) dispersos. Dizem respeito à vida pessoal e política do antigo presidente e foram, só agora, reunidos. Estes documentos encontravam-se arquivados, na sua maior parte, no Centro de Memória e diálogo Nelson Mandela e a sua organização foi coordenada por Verne Harris.
O livro está organizado em quatro partes: pastoral, drama, epopeia e tragicomédia. Em cada uma das partes há capítulos que versam, entre outros, sobre temas como “Comunidade” (capítulo 2) “Não há razão para matar” (capítulo 4); “As cadeias do corpo” (capítulo 6); “Homem inadaptado” (capítulo 7); “Táctica” (capítulo 10); “Tempo de calendário” (capítulo 11) e “Em viagem” (capítulo 13). O prefácio do livro é escrito por Barack Obama, o presidente dos Estados Unidos.
Através das palavras do mais conhecido prisioneiro de Robben Island testemunhamos acontecimentos da história recente da África do Sul. O mais impressionante é a sua capacidade de resistir, com coragem, serenidade, gentileza e lucidez, às mais terríveis adversidades, físicas e psicológicas. Mandela nunca desistiu de dialogar, mesmo nas condições mais extremas. Perante guardas que tratavam os prisioneiros políticos como seres não humanos, submetendo-os a tortura e a humilhações sistemáticas, ele procura, através de argumentos racionais e de forma persistente, convencê-los a mudar o seu comportamento para com os presos.
Nas cartas e entrevistas transcritas encontram-se reflexões sobre a natureza humana, a política, o sentido da vida, a resistência às injustiças sociais, o exercício do poder político, por exemplo. A simplicidade e a clareza com que são apresentadas as ideias e a coerência que Mandela tem mantido, ao longo da sua vida, em relação aos ideais políticos da democracia, da igualdade e da justiça, fazem dele um homem admirável.
Com humildade, ele alerta-nos para a possibilidade de, por ter passado tanto tempo na prisão, ter projectado, involuntariamente, uma falsa imagem de si. E repete, diversas vezes ao longo desta obra, que nunca foi um santo, mas sim um ser humano falível e inseguro.
Como ele próprio explica: “Sempre me movimentei em círculos onde o senso comum e a experiência prática eram importantes, e onde elevadas qualificações académicas não eram necessariamente decisivas. Pouco do que me tinha sido ensinado na faculdade parecia directamente relevante no meu novo ambiente. Qualquer professor médio evitava temas como a opressão racial, a falta de oportunidades para os negros e as inúmeras indignidades a que estão sujeitos na vida do dia-a-dia. Nenhum professor me disse alguma vez como erradicar os malefícios dos preconceitos raciais, nem me indicou livros que eu poderia ler sobre este assunto, ou as organizações políticas a que me poderia associar se quisesse fazer parte de um movimento de libertação disciplinado. Tive de aprender todas estas coisas aleatoriamente e através de tentativas e erros.”
Nelson Mandela, “Arquivo íntimo” , Lisboa, 2010, Editora Objectiva, págs. 122 e 27.
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