domingo, 21 de junho de 2020

A filosofia por vezes vai ao cinema


Muitas pessoas «acham que a vida não tem sentido sem Deus, e que a perspetiva de nada haver para além da morte torna a vida paralisantemente vazia. Esta visão é expressa numa cena de um filme de Bergman, O Sétimo Selo (1957), em que o cavaleiro medieval fala com a figura encapuzada da morte. [O cavaleiro joga uma partida de xadrez com a Morte para tentar adiar a sua morte.]

“Cavaleiro: Eu quero o conhecimento! Não a fé, nem presunções, quero o conhecimento! Quero que Deus me estenda a sua mão, que me mostre a sua face e fale comigo.
Morte: Mas Ele permanece em silêncio.
Cavaleiro: Eu chamo por Ele na Escuridão. Mas é como se não estivesse lá ninguém.
Morte: Se calhar é porque não está lá ninguém.
Cavaleiro: Então a vida é um tremendo absurdo. Ninguém pode viver confrontado com a morte se souber que tudo se resume a nada.”»
Dan O’ Brien, Introdução à Teoria do Conhecimento, Gradiva, Lisboa, 2013, pág. 349.

A filosofia por vezes vai ao cinema. Neste pequeno diálogo encontramos referências a diversos tópicos filosóficos:

- o problema do sentido da vida (e a perspetiva de que esta sem Deus é absurda);
- o chamado “argumento da ocultação divina”, contra a existência de Deus (“chamo por Ele na Escuridão. Mas é como se não estivesse lá ninguém”);
- a rejeição do fideísmo (“quero o conhecimento! Não a fé”);
e, talvez mais discutivelmente,
- a falácia do apelo às consequências (alegar que uma ideia é verdadeira ou falsa em função das suas consequências serem desejadas ou indesejadas – o cavaleiro sugere que Deus tem de existir senão “a vida é um tremendo absurdo”). 

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