No 1º teste do segundo período (Fevereiro) perguntei aos alunos: “existe ou não livre arbítrio?”, e pedi para justificarem as suas opiniões. As duas melhores respostas foram do Lucas Sá, do 10º A, e do Rafael Fonseca, do 10º D.
O Lucas nega a existência do livre-arbítrio, enquanto o Rafael defende a sua existência.
Na minha opinião, o livre-arbítrio não existe e a teoria que melhor resolve o problema do livre-arbítrio é o Determinismo Radical. Como estudámos, as ações humanas são acontecimentos e todos os acontecimentos têm uma causa. Quer consideremos o computador que se estragou ou a queda de um meteorito, iremos invariavelmente encontrar causas para todos os acontecimentos conhecidos. É por conseguinte plausível, e na minha opinião bastante provável, que também as nossas ações tenham causas: fenómenos físicas, costumes socioculturais, fenómenos psicológicos, a nossa educação, etc. Assim sendo, se não existem acontecimentos sem causas, como poderiam as nossas ações serem livres? A ciência demonstra-nos que para o mesmo conjunto de causas existe sempre o mesmo efeito. Transportando este conhecimento para o problema do livre-arbítrio, para um determinado conjunto de causas apenas existe um efeito, que é a ação praticada e que não poderia ser qualquer outra.
O Libertismo, que defende a existência do livre-arbítrio e nega a existência do determinismo, tem várias objeções ao Determinismo Radical, cada uma menos sólida que a outra. Defendem que algumas ações não têm causas pois não as sentimos, o que me parece pouco razoável, pois se não temos, muitas vezes, a consciência da existência de causas, como podemos possivelmente sentir a sua ausência? O libertista defende então que se não existir livre-arbítrio, a vida não tem sentido. Mas porque é que não haveria de ter? Se uma entidade suprema e muito mais poderosa que nós nos controlasse a seu bel-prazer, a vida de facto não teria sentido. Mas não é isso que acontece. O que nos conduz a uma determinada ação são causas várias que nada têm de superior: são fenómenos naturais e sociais que fazem parte da vida. Assim sendo, e apesar de considerar que o livre-arbítrio não existe, penso que a minha vida não perdeu o sentido. Por fim, o libertista invoca o argumento da responsabilidade, que diz que apenas faz sentido responsabilizar as pessoas pelas suas ações caso exista livre-arbítrio. É Um facto que todos nós responsabilizamos as outras pessoas, mas na minha opinião o raciocínio libertista não está correto por duas razões: em primeiro lugar, se todos os acontecimentos são causados por causas anteriores, o facto de responsabilizarmos as pessoas e de as criticarmos/elogiarmos também é provavelmente determinado e inevitável; por outro lado, pode-se abordar a questão da responsabilidade dizendo que ao criarmos castigos/prémios para os culpados/merecedores de aprovação, estes castigos/prémios tornar-se-ão uma causa para as pessoas do futuro e poderão levar a que essas pessoas se “portem melhor” (pratiquem ações corretas devido à existência de prémios e não pratiquem ações erradas devido à existência de castigos). Assim sendo, penso que o Libertismo está totalmente errado, e que os libertistas defendem o livre-arbítrio talvez por esta crença ser a mais atraente e não a mais justificada.
Posso então comparar o Determinismo Radical e o Determismo Moderado. Ambos defendem a existência de causas anteriores à ação, mas enquanto que o DR rejeita o livre-arbítrio, o DM defende a sua existência. Como já referi, não acredito na existência de livre-arbítrio, e penso que o Determinismo Moderado tem uma má abordagem do problema, pois defende que todas as ações têm causas anteriores, mas que algumas são livres pois não existem coações imediatas. Na minha opinião, o que o Determinismo Moderado faz é “baixar a fasquia”, ou seja, simplifica a questão. Para conseguir compatibilizar o determinismo com o livre-arbítrio, o determinista moderado altera a conceção de “livre-arbítrio”: enquanto que para o Libertismo e para o Determinismo Radical o livre-arbítrio é a ausência de causas anteriores à vontade do agente (autodeterminação) e de coação imediata, o Determinismo Moderado entende-o apenas como a ausência de coação (se não houver coação, a ação é livre). Penso que o que o determinista moderado faz é empobrecer o conceito, é simplificar o que não é simplificável. Como poderá algo tão profundo e complexo como o livre-arbítrio ser a mera ausência de coação? O determinista moderado contrapõe dizendo que a autodeterminação é um mito e que a discussão libertista vs determinista radical é fútil. Mas penso que não é. Se a autodeterminação existir, existem ações livres, caso contrário elas não existem. Mas podemos abordar a questão por outro lado. Consideremos duas situações iguais, em que todas as causas foram iguais, por exemplo, dois mundos paralelos (vamos assumir que existem). Nestes dois mundos, existe um mesmo indivíduo, e tudo o que aconteceu antes na sua vida foi igual, não há uma única diferença. Este indivíduo encontra-se então perante uma bifurcação, e não existem coações imediatas que o impeçam (ou obriguem) de seguir para qualquer um dos lados, ou seja, sobre a “escolha” de ir para a esquerda ou para a direita. Poderá o indivíduo realmente escolher ir para a direita num mundo e para a esquerda noutro? Já vimos que a mesma causa levam ao mesmo efeito, e não sendo o ser humano especial, penso que ele não pode optar por caminhos diferentes. Ou seja, não existem possibilidades alternativas, e como tal, ainda que não existam coações imediatas, a escolha do indivíduo não é realmente livre, pois ele não fez o quis, mas sim o que estava determinado. Posto isto, penso que também o Determinismo Moderado não tem uma boa resposta ao problema do livre-arbítrio.
Finalizando o meu raciocínio, “sobra-me” apenas o Determinismo Radical, que defende a “não-existência” do livre-arbítrio. Poderá não ser a opção mais atraente e apelativa, mas parece-me ser a melhor fundamentada e defendida. Concluindo assim como iniciei, na minha opinião, o livre-arbítrio não existe.
Lucas Seara de Sá, 10ºA.
Vou defender que existe livre-arbítrio se o entendermos à semelhança da teoria conhecida como Determinismo Moderado (DM). Contudo, não existe livre-arbítrio em termos de realizar uma ação autodeterminada, isto é, sem causas anteriores excetuando a própria vontade do agente. Isso é impossível pois os nossos genes, a nossa personalidade, fatores familiares, fatores sociais, etc. estão-nos sempre a influenciar, embora geralmente não tenhamos consciência disso. Portanto, podemos ver que o Libertismo é uma teoria falhada, pois o seu principal argumento (Se algumas ações não têm causas anteriores, então são livres; algumas ações não têm causas anteriores; logo, são livres) está errado e poderíamos arranjar inúmeras provas empíricas para defender que, de facto, somos influenciados naquilo que fazemos, pelas causas referidas acima. Se fizermos a experiência mental de escolher aleatoriamente uma ação X qualquer que tenhamos realizado, e perguntarmos porque fizemos essa ação encontraremos sempre um desses fatores, ou até mais do que um. E se nos questionarmos sobre a causa desse fator encontraremos outro fator anterior, e por aí adiante; ou seja, descobriremos uma enorme teia causal, remetendo até a acontecimentos longínquos que afetaram a ação X.
É, então, impossível realizar uma ação autodeterminada.
Restam o Determinismo Radical (DR) e o DM, sendo a primeira uma teoria incompatibilista e a segunda compatibilista. O DR defende que todas as ações são determinadas por causas anteriores e por isso não existe livre-arbítrio. O DM defende que todas as ações são determinadas por causas anteriores mas que isso não é incompatível com a existência de livre-arbítrio.
Bem, se o livre-arbítrio como autodeterminação não existe, teremos que aceitar o DR? Segundo o DM, o conceito do livre-arbítrio como autodeterminação é apenas uma fantasia, um desejo, o reflexo da necessidade do Homem de sentir que tem algum controlo sobre si mesmo. De facto, parece muito implausível que possam existir ações sem causas anteriores. Mas isso não significa que o DR seja a resposta.
Penso que aceitar o DR como verdadeiro seria enlouquecedor. Como poderia a vida ter sentido se tudo o que fazemos fosse predeterminado? Se acreditasse realmente que não tenho livre-arbítrio, sentir-me ia encurralado. Se não existisse livre-arbítrio, a responsabilidade desapareceria. Como poderíamos condenar assassinos e louvar heróis se as suas ações seriam igualmente desprovidas de liberdade, se seriam ambos prisioneiros dos seus fatores precedentes, sofrendo de uma total ausência de controlo?
O DM tem então a resposta. Sim, somos influenciados por fatores anteriores em tudo o que fazemos, mas isso não nos tira o livre-arbítrio. As nossas ações são livres desde que não sejamos alvos de coações imediatas, internas ou externas. (Por exemplo, se entregarmos a carteira a um ladrão que tem uma faca encostada ao nosso pescoço não realizaremos uma ação livre.) E isso está de acordo com a experiência da generalidade das pessoas. Antes de tomar uma decisão, antes de realizar uma ação, temos a experiência de liberdade. Conseguimos sentir que tanto podemos escolher uma opção como podemos escolher outra. Sentimo-nos a deliberar, e quando tomamos uma decisão não sentimos que fomos forçados a escolhê-la. Sentimos que foi uma decisão livre e que não fomos obrigados a tomá-la. Digamos que preciso de escolher entre ir a uma festa de um amigo ou a fazer voluntariado para uma instituição de caridade. Sempre fui educado com base na ajuda ao próximo, e no bem geral. No entanto, ao tomar esta decisão sinto-me a deliberar. Peso os prós e os contras de cada escolha que tenho, e mesmo que tenha sido educado para fazer a segunda escolha posso perfeitamente contrariar esse fator e ir na mesma à festa do amigo. A minha educação não me consegue obrigar a escolher um certo caminho. Na minha mente, estes fatores prévios sugerem fortemente que eu faça uma certa escolha, fazem pressão mental. Acho até bastante adequado uma comparação dos fatores prévios com lobistas na política, tentando pressionar-me a tomar uma certa decisão. No entanto, nunca me forçam e a derradeira escolha cabe-me a mim. Influenciam-me sem dúvida, mas não me constrangem, não me obrigam. Por isso, essa ação é simultaneamente determinada e livre.
Rafael Fonseca, 10º D.