terça-feira, 28 de abril de 2020

Argumento cosmológico: o texto de Tomás de Aquino e algumas reconstituições do argumento


Tomás de Aquino, de Gentile da Fabriano (1370-1427)


«A existência de Deus pode ser provada de cinco maneiras:
(…) A segunda maneira parte da natureza da causa eficiente. No mundo dos sentidos encontramos uma ordem de causas eficientes. Não há qualquer caso conhecido (nem isso seria, de facto, possível) em que uma coisa é causa eficiente de si própria. Para isto, teria de ser anterior a si própria, o que é impossível. Ora, não é possível haver uma série infinita de causas eficientes, porque nas causas que se seguem umas às outras na série, a primeira é a causa da intermédia, e esta é a causa da última, sejam várias ou apenas uma as causas intermédias. Ora, fazer desaparecer a causa é fazer desaparecer o efeito. Logo, se não há uma primeira causa na série das causas eficientes não haverá uma última nem qualquer causa intermédia. Mas se é possível haver uma série infinita de causas eficientes, não há uma primeira causa eficiente, nem um efeito último, nem quaisquer causas eficientes intermédias; tudo isto é obviamente falso. Logo, é necessário admitir uma primeira causa eficiente, a que todos dão o nome de Deus.»



Confrontar os alunos com o texto do próprio Tomás de Aquino parece-me pedagogicamente acertado, mas convém apresentar uma reconstituição do argumento de modo a facilitar a compreensão e a discussão. Eis três possibilidades:


«Premissa 1: No mundo, todas as coisas têm uma causa.
Premissa 2: Nada pode ser a causa de si próprio.
Premissa 3: As cadeias causais não podem regredir infinitamente.
Logo, existe uma causa primeira que é Deus.»

Aires Almeida e outros, A Arte de Pensar – volume 2, Didáctica Editora, Lisboa, 2007, pág. 133.


«1. Na natureza ocorrem acontecimentos.
2. Na natureza todo o acontecimento tem uma causa e nenhum acontecimento é a causa de si mesmo.
3. Na natureza as causas precedem os efeitos.
4. Na natureza não há cadeias infinitas de causa/efeito.
5. Logo, há uma entidade fora da natureza (um ser sobrenatural) que causa o primeiro acontecimento que ocorre na natureza.
6. Logo, Deus existe.»

Artur Polónio e outros, Criticamente, de Porto Editora, 2007, pág. 227.


«1. Existem coisas no mundo.
2. Se existem coisas no mundo, então tais coisas foram causadas a existir por alguma outra coisa.
3. Se as coisas do mundo foram causadas a existir por alguma outra coisa, então ou há uma cadeia causal que regride infinitamente ou há apenas uma primeira causa que é a origem da cadeia causal.
4. Mas não há uma cadeia causal que regride infinitamente.
5. Logo, há apenas uma maneira causa (a que chamamos Deus) que é a origem da cadeia causal. (De 1 a 4)»

Domingos Faria e Luís Veríssimo, Exame 11, Leya, Lisboa, 2020, pág. 258.

Imagem: Tomás de Aquino, de Gentile da Fabriano (1370-1427)

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