sexta-feira, 1 de maio de 2020

Não nos devemos resignar com a injustiça

gg_robert_kidd_02 Lewis Hine criança operário trabalho infantil
Fotografia de Lewis Hine 

Podemos «rejeitar a afirmação de que a ordenação das instituições é sempre deficiente porque a distribuição natural de talentos e as circunstâncias sociais são injustas, estendendo-se estas injustiças, inevitavelmente, às estruturas concebidas pelos homens. Por vezes, esta reflexão surge como uma desculpa para ignorar a injustiça, como se a recusa em aceitar a injustiça fosse da mesma natureza que a impossibilidade em aceitar a morte. A distribuição natural não é justa nem injusta; tal como não é injusto que se nasça numa determinada posição social. Trata-se de simples factos naturais. A forma como as instituições lidam com estes factos é que pode ser justa ou injusta. As sociedades aristocráticas ou de casta são injustas porque fazem desta circunstância a base que determina as classes sociais mais ou menos fechadas e privilegiadas. A estrutura básica destas sociedades incorpora a arbitrariedade que encontramos na natureza. Mas não é necessário que os homens se resignem a tais contingências. O sistema social não é uma ordem imutável, para lá do controlo humano, mas um padrão da ação humana. Na teoria da justiça como equidade os homens, os homens acordam em aproveitar os incidentes da natureza e as circunstâncias sociais apenas quando tal resulta em benefício de todos [de acordo com o princípio da diferença apenas são aceitáveis as desigualdades que redundem em benefício de todos e, principalmente, dos mais desfavorecidos]. Os dois princípios [da justiça] são uma forma equitativa de contrariar a arbitrariedade da sorte e, embora sejam sem dúvida imperfeitas quando analisadas sob outros ângulos, as instituições que satisfazem estes princípios são justas.»

John Rawls, Uma Teoria da Justiça, Editorial Presença, 3ª edição, 2013, Lisboa, pág. 96.

(Tradução de Carlos Pinto Correia.)

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