«(…) a minha experiência de regularidades no passado é tomada como justificação de crenças acerca de coisas de que não tenho experiência. É importante notar que este tipo de raciocínio é apresentado muitas vezes como relativo apenas ao nosso conhecimento do futuro, o que não é correto. Os argumentos indutivos dizem respeito ao futuro, ao presente e ao passado (…)
É importante que estejamos cientes da natureza radical da tese de Hume. Ele argumenta que todo o raciocínio indutivo é inválido: não temos razões a priori ou empíricas para aceitar crenças baseadas em inferências indutivas. Não temos justificação para acreditar que o Sol vai nascer amanhã. O ponto crucial é este: se eu afirmar que o Sol vai nascer amanhã e o meu amigo afirmar que ele se vai transformar num ovo estrelado gigante, a minha crença não é, de acordo com Hume, mais justificada do que a do meu amigo.
Claro que eu não tenho amigo algum que acredite nisso, e Hume tem uma explicação para esse facto. Devido ao “costume” ou ao “hábito”, todos pensamos em termos indutivos. Contudo, este tipo de pensamentos não é justificado; resulta apenas de certas disposições psicológicas que criaturas como nós possuem: “não é, portanto, a razão que é o guia da vida, mas sim o costume” (…). No seu Tratado de 1739, Hume sustenta esta tese fornecendo uma explicação causal rudimentar para o facto de termos as crenças que temos (…). Os animais também têm essas disposições: são guiados pelo costume e esperam que as regularidades que experienciaram continuem. Contudo, como observa Russell (1912), a galinha a que o agricultor dá de comer todos os dias pode ser degolada amanhã. A nossa posição é análoga à da galinha: esperamos que o Sol nasça todas as manhãs tal como a galinha espera o seu alimento, mas nenhum de nós tem qualquer justificação para as nossas crenças ou comportamento.
Uma resposta comum a esta posição céptica é que sabemos que o Sol irá nascer amanhã porque temos uma explicação científica para que tal aconteça, descrevendo o movimento da Terra em relação ao Sol. Aqui, no entanto, podemos ver todo o alcance do argumento de Hume. Chegámos à nossa narrativa através de sucessivas observações astronómicas. A nossa explicação do nascer do Sol é, portanto, indutiva, pelo que está igualmente sujeita ao argumento de Hume. De acordo com Hume, o cientista não pode justificar a sua crença de que a gravidade continuará a manter os corpos celestes nas órbitas que até agora temos observado.»
Dan O´ Brien, Introdução à teoria do conhecimento, Gradiva Editora, Lisboa: 2013, págs. 227-28.
1. Esclareça, a partir de exemplos, o que são argumentos indutivos.
2. Quais são as razões que levam Hume a considerar que os argumentos indutivos não se encontram justificados nem racionalmente nem empiricamente?
3. Explique o título atribuído a este post: “Não podemos saber se o Sol vai nascer amanhã.”
4. As inferências indutivas, para Hume, baseiam-se no hábito ou costume. Explique porquê.
5. Porque motivo a explicação científica do nascimento do Sol não permite ultrapassar as objeções cépticas de Hume?
6. O cepticismo de Hume quanto à explicação científica dos fenómenos é refutável? Como?
2 comentários:
Podia carregar a correção aqui para que possamos estudar para o exame nacional de filosofia...
Obrigado pela atenção... Pedro - Leiria
Será que podia publicar a correção? É que preciso muito para estudar. Obrigada
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