Todos os governos têm feito a mesma coisa na educação: identificam coisas que acham erradas e fazem mudanças avulsas e mal preparadas que geralmente pioram a situação. Trocam coisas boas por coisas piores e corrigem mal coisas más. O atual governo já fez algumas dessas mudanças desastrosas e prepara-se para fazer outras. Um exemplo notório das que já foram feitas é a extinção dos exames no 1º e 2º Ciclo. Relativamente às que aí vêm, a pior (pelo menos enquanto não tentarem abolir as reprovações) é o regresso de disciplinas como Área de Projeto e Formação Cívica (neste caso no secundário, pois já existe nos Ciclos anteriores). Felizmente nem tudo é mau e há pelo menos duas intenções boas: reduzir o tamanho dos programas e redistribuir as cargas horárias das disciplinas, dado que algumas têm muitos tempos letivos e outras poucos. Veremos se essas intenções se concretizam e, caso se concretizem, se a redução e a redistribuição são bem feitas.
Quase toda a gente reconhece que os alunos têm aulas a mais e passam demasiadas horas na escola. Isso repercute-se por exemplo no peso das mochilas, que – como tem sido denunciado – é excessivo e prejudicial à saúde. Mas se é assim, é absurdo criar novas disciplinas. Novas disciplinas implicam mais tempo na escola e mochilas ainda mais pesadas.
Contudo, há argumentos mais fortes contra a existência desse género de disciplinas. Um deles é que, como mostra a experiência passada, não são eficazes.
Os alunos não aprendem a fazer trabalhos de pesquisa nem desenvolvem a sua autonomia fazendo trabalhos sobre temas vagos e desligados dos temas curriculares, como é típico de uma coisa chamada Área de Projeto. A interdisciplinaridade assim conseguida geralmente é nominal e não real: é apenas algo que fica escrito nos papéis que os professores são obrigados a preencher, mas não acrescenta nem competências nem conhecimentos aos alunos. Um inquérito a alunos que há anos atrás tiveram Área de Projeto no 12º ano e a alunos que têm disciplinas afins (com nomes diversos) na Universidade mostraria que a maioria deles as veem como disciplinas menores e até desprezíveis. Para que os alunos desenvolvam competências de pesquisa nada melhor que pedir-lhes trabalhos nas disciplinas curriculares e acompanhá-los na sua realização, mas para isso é preciso reunir algumas condições, nomeadamente tempo (os programas não deverão ser tão extensos como atualmente) e um mínimo de articulação entre os programas das várias disciplinas, para que a interdisciplinaridade não seja uma miragem que nunca sai do papel.
Quanto à Formação Cívica: a autêntica educação para a cidadania não é a “catequese” politicamente correta que geralmente faz parte dos programas dessa disciplina, mas sim um bom ensino das outras disciplinas. Na Filosofia, nas línguas estrangeiras, no Português, na Biologia, na História, entre várias outras disciplinas, há muitos temas cuja lecionação pode promover eficazmente – se incluir informação rigorosa e imparcial, debate dos aspetos polémicos, etc. – os valores democráticos, os direitos humanos e o respeito pela natureza, entre outras atitudes estimáveis. Fornecer, numa aula de Biologia, informações rigorosas sobre a genética e as raças é muito mais eficaz no combate ao racismo do que pedir aos alunos, em Formação Cívica, trabalhos de grupo panfletários sobre a igualdade racial. Discutir o relativismo cultural numa aula de Filosofia (por exemplo: criticar a excisão e o casamento de crianças implica desrespeitar os povos que têm esses costumes?) faz mais pela compreensão da importância dos direitos humanos do que a sua apologia em tom de sermão numa aula de Formação Cívica.
Por isso, uma boa maneira de aliviar as tardes e as costas dos alunos seria não fazer regressar essas disciplinas. Quanto à Formação Cívica que atualmente existe devia mudar o nome para Assuntos da Direção de Turma, que é a sensata função que muitos diretores de turma atualmente lhe dão.
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