terça-feira, 26 de outubro de 2010

Os líderes políticos, a preguiça e a obediência

 poder01quino

Cartoon da autoria de Quino.

A actual situação política - as fotografias que observei num jornal de hoje e um certo sentimento de descrença e de cepticismo em relação ao futuro – explicam a escolha do texto a seguir citado. Cabe ao leitor avaliar se as ideias a seguir transcritas têm, nem que seja remotamente, algo a ver com a realidade.

«Tanto Aristóteles como Cícero acreditavam que ninguém podia ser bom chefe se não tivesse antes aprendido a obedecer. Esta opinião vigora ainda no seio dos partidos políticos, onde, para trepar o pau ensebado da ambição, é necessário primeiro obedecer às ambições partidárias. Poder-se-ia perguntar se a capacidade de adaptar as opiniões próprias e ser-se conformista são qualidades desejáveis num chefe, mas um cínico diria que, porque na política os princípios são um estorvo e a hipocrisia uma virtude, poderá ter de assim ser (…).

Alguns dizem que um chefe que seja amável, revele consideração e esteja disposto a dar o exemplo será seguido de bom grado e lealmente. Mas também é verdade, como Homero diz, na tradução de Alexander Pope, que “o chefe que se confunde com as hostes vulgares/Perde-se nas massas da matéria comum”. (…) Contudo, espíritos igualmente sábios notam que, quando o chefe é obrigado – como tantas vezes sucede – a tomar decisões impopulares e executar acções desagradáveis, aquilo que era obediência leal e voluntária transforma-se num maior descontentamento, quando o chefe não tem com os seus seguidores uma relação meramente pragmática.

Segundo algumas opiniões, a principal razão por que a história está juncada de demagogos é a preguiça e a fraqueza das massas (…). Colectivamente, as pessoas parecem apreciar um chefe firme, um timoneiro, um Führer. Pensam que a sua mão férrea as colocará ao abrigo de uma maior degradação – que todas as gerações crêem iminente – da sua ordem social, moral e económica, cujo período áureo ocorreu no passado (ou talvez tenha coincidido com o das suas infâncias).»

A. C. Grayling, O significado das coisas, Lisboa, 2002, Edições Gradiva, pp. 223-225.

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