«Todas estas
questões indescritivelmente esquisitas sobre números, propriedades, indivíduos,
espaço, tempo, causalidade, mentes, possibilidade, probabilidade, necessidade,
obrigação, razões, leis, Deus… Não só são as questões individualmente
esquisitas, como em conjunto não formam mais do que um caos, sendo um desafio a
qualquer tentativa de as reduzir a uma sequência racional. E para mais nenhuma
das questões parece alguma vez chegar a ser finalmente respondida. É realmente
uma cena perturbadora, quando nos afastamos e contemplamos o todo. O mais
penoso é o contraste que apresenta relativamente à ciência, tomada como um
todo. Na verdade, dificilmente é possível a alguém […] não se perguntar por que
razão há-de haver filósofos, de todo em todo (…)
O Professor de
História, IJ, nem sempre consegue calar as suas perplexidades sobre a
inevitabilidade histórica, e dá consigo a perguntar, como os filósofos, quais
são as condições de verdade de uma afirmação como “Hitler teria ganho a guerra
se não tivesse atacado a Rússia”. KL, o Professor de Medicina, ainda que nada
mais o empurre nessa direção, é levado pela sua nova tecnologia a enfrentar
deliberações agonizantes sobre os deveres de um médico para com os seus
doentes. E assim por diante. Por outras palavras, as pessoas inteligentes,
entregues a si mesmas, acabarão por filosofar, mais tarde ou mais cedo, seja
qual for o campo de trabalho intelectual a que se entreguem, ou mesmo que a
nenhum se entreguem. O impulso para a filosofia é de facto tão natural e tão
forte que nada se conhece, exceto o terror totalitarista, que consiga
reprimi-lo em absoluto. Numa sociedade não-totalitarista, pois, a filosofia
será feita, e a única questão prática que resta é como haverá melhores
hipóteses de ser bem feita, ou por quem.»
David Stove, “Por que razão há filósofos?”, Crítica - https://criticanarede.com/porquehafilosofos.html
Pintura: Gerrit Dou, “Astronomer by candlelight”.
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