segunda-feira, 28 de junho de 2010

A excisão genital feminina: o testemunho de Waris Dirie

Estreou, recentemente nos cinemas portugueses, um filme baseado na história da modelo somali Waris Dirie, chamado Flor do deserto.  Waris Dirie nasceu numa família nómada da Somália  e  foi submetida a uma prática imoral, mas vulgar no seu país e em vários outros, chamada mutilação genital feminina ou excisão. Mais tarde, quando se tornou conhecida internacionalmente, escreveu um livro e tornou-se uma activista contra essa tradição cultural.

Este testemunho mostra-nos como o respeito pela diversidade cultural de um povo não pode confundir-se, como é frequente, com a defesa do relativismo cultural. Assim, se admitíssemos um dos pressupostos fundamentais desta teoria: o que é moralmente certo ou errado depende dos padrões culturais aprovados pela maioria das pessoas pertencentes a uma determinada sociedade, ficaríamos impedidos de considerar que, do ponto de vista racional, esta é uma prática absurda que viola alguns dos direitos humanos fundamentais.

Portanto, nem todos os valores morais são relativos, nem todas as tradições culturais são respeitáveis. Ou não?

5 comentários:

Anónimo disse...

Oi. Estou montando meu TCC sobre o mito da liberdade feminina da mulher contemporânea, um estudo sobre a obra filosofica de Simone de Beauvoir...e a dica deste filme me é muito pertinente...

Obrigada!

Patrícia Castro disse...

Excelente dica de filme! Eu já sabia da existência do livro e um pouco da vida da modelo, embora não tenho o lido. Um abraço

Sara Raposo disse...

Obrigado a ambas pelos vossos comentários.

G. Ruiz disse...

Olá, estou visitando o blog pela primeira vez. Achei pertinente o tema, também por já ter participado de alguma discussão relacionada. O costume são práticas humanas que, por algum motivo, positivo ou negativo, se reiteram na história de uma sociedade. A relativização da cultura e, por conseguinte, das leis, da moral e do costume que pertencem a determinado povo, muitas vezes serve para que sejam conservados valores desumanos entranhados no seio dessas sociedades. Não quer dizer isso que há culturas superiores ou culturas inferiores no planeta, e nenhuma nação tem direito de impor suas leis a outra. O que acontece é que, do ponto de vista dos direitos humanos, deve-se analisar a quem servem tais práticas, quem sofre, no caso em comento, com elas. Sendo assim, a excisão genital feminina é um costume que deve ser combatido, e principalmente pelas mulheres que sofrem com essa prática. Porque a elas deve pertencer a liberdade sobre seus próprios corpos.

Sara Raposo disse...

Ruiz:

A defesa do relativismo cultural pode ser e é, muitas vezes, uma forma de ocultar a violação de direitos humanos fundamentais, em particular das mulheres. Veja-se por exemplo países como a Arábia Saudita e o Afeganistão, onde as tradições religiosas, por exemplo, impedem as mulheres de ter direitos fundamentais quer na sua vida privada quer profissional. Para as mulheres que vivem nestas sociedades é difícil, por vezes, ter consciência dos seus próprios direitos e reivindicar uma alteração dos costumes. Esta última teria de passar pela educação e o acesso a modelos sociais diferentes dos que se encontram instituídos.

Disse no seu comentário o seguinte: "Não quer dizer isso que há culturas superiores ou culturas inferiores no planeta, e nenhuma nação tem direito de impor suas leis a outra". A defesa do etnocentrismo não faz sentido, concordo consigo. No entanto, há certas práticas culturais que
que são moralmente erradas e portanto, de facto, devem ser condenadas em nome de valores universais que respeitem a dignidade das pessoas, independentemente da cultura a que estas pertençam. Dizer que certos hábitos culturais estão errados e deviam acabar não significa pôr em causa a totalidade da cultura de um povo ou desrespeitá-lo, considerando-o inferior. O que importa é a justificação racional apresentada.

Considera possível conciliar a defesa de valores universais (como os direitos humanos) como o relativismo cultural?

Cumprimentos.